QUINTA-FEIRA SANTA: O AMOR COMEÇA AQUI

A Missa da Ceia do Senhor, celebrada na Quinta-feira Santa ao entardecer, dá início ao Tríduo Pascal. É o primeiro passo da caminhada com Jesus em sua paixão, morte e ressurreição. Essa celebração não é apenas memória de um fato passado, mas a atualização viva do gesto de amor mais profundo: a entrega total de Jesus por nós.

Logo no início da liturgia, a antífona já aponta para o mistério que celebramos: “A cruz de nosso Senhor Jesus Cristo deve ser a nossa glória; nele está nossa vida e ressurreição; foi ele que nos salvou e libertou.”

A Ceia não é um rito isolado. É parte de uma história de salvação que começa com o povo hebreu, na noite da libertação do Egito. “É a Páscoa, a passagem do Senhor!” (Ex 12,11).

O cordeiro imolado, o sangue nos umbrais das portas, a refeição partilhada às pressas: tudo isso anuncia o verdadeiro Cordeiro, Jesus, que entrega seu corpo e derrama seu sangue como sinal de uma nova aliança. “Isto é o meu corpo dado por vós… este cálice é a nova aliança em meu sangue.” (1Cor 11,24-25)

Mas a Ceia não para no altar. Durante o jantar, Jesus levanta-se, tira o manto, pega uma toalha, se abaixa e começa a lavar os pés dos discípulos. Um gesto escandaloso. Um amor que se ajoelha. “Se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros.” (Jo 13,14)

Na Quinta-feira Santa, celebramos o coração da fé cristã: um Deus que se faz pão, que se faz serviço, que se doa por inteiro. Participar desta Eucaristia é assumir o compromisso de viver como Ele viveu, amar como Ele amou e servir como Ele serviu. Não é apenas uma missa bonita. É um chamado. “Fazei isto em memória de mim.” (1Cor 11,24)

Celebrar a Ceia do Senhor é dizer com a vida: estamos dispostos a continuar o caminho do amor até o fim.

Páscoa: O Sacrifício e a Renovação da Aliança

A Páscoa é um momento de profunda reflexão sobre o sacrifício, a renovação da aliança e a presença divina em nossas vidas. Ao longo das Escrituras, somos convidados a vivenciar a Páscoa não apenas como um evento histórico, mas como uma experiência de transformação pessoal e espiritual.

No Êxodo 12,1-8.11-14, vemos o povo de Israel, em meio à opressão no Egito, ser orientado a celebrar a Páscoa com um sacrifício de cordeiro e a marca de seu sangue nas portas como sinal de salvação. Esta primeira Páscoa é um marco da libertação divina, simbolizando a passagem da escravidão para a liberdade, do sofrimento para a esperança. Ela nos convida a refletir sobre o sacrifício que Deus fez em favor de Seu povo e nos recorda da importância de viver na fidelidade à Sua Palavra.

O Salmo 115,12-13.15-16bc.17-18 ecoa esse sentimento de gratidão e confiança em Deus, que libertou e guiou Seu povo. Ele nos lembra de que, ao recebermos as bênçãos divinas, devemos responder com ação de graças e compromisso com a Aliança. “Como retribuirei ao Senhor por tudo o que Ele me fez?” (Sl 115,12). A resposta a essa pergunta é encontrada no amor e no serviço a Deus e ao próximo, que se manifestam, especialmente, na participação na Ceia do Senhor.

Na Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios 11,23-26, a Eucaristia é revelada como o memorial do sacrifício de Cristo, que, ao instituir a Ceia, transforma o pão e o vinho em Seu Corpo e Sangue. Paulo nos ensina que, ao partilhar deste mistério, renovamos a nossa aliança com Cristo e proclamamos Sua morte e ressurreição até que Ele venha. A Eucaristia, assim, não é apenas um ato de recordação, mas uma vivência profunda da presença de Cristo em nossa vida.

Finalmente, no Evangelho de João 13,1-15, somos chamados a imitar o gesto de humildade e serviço de Jesus, que, ao lavar os pés dos Seus discípulos, nos ensina o verdadeiro caminho do amor. Ele, que é Senhor e Mestre, se faz servo, mostrando que, para viver a Páscoa em plenitude, devemos abraçar o serviço e o amor ao próximo. A humildade e a pureza de coração são essenciais para participar da Páscoa de Cristo, pois é somente através delas que podemos experimentar a verdadeira liberdade e salvação.

O que significa este gesto de Jesus de lavar os pés dos discípulos?

A Páscoa, portanto, não é apenas um rito de lembrança, mas uma vivência de fé, uma renovação da aliança com Deus, e um convite para que, como Cristo, possamos nos doar em amor e serviço ao próximo. Que, ao celebrarmos este tempo sagrado, possamos experimentar, em nossas vidas, a verdadeira libertação e a paz que Cristo nos oferece, nos chamando a viver uma vida de amor e serviço.

No contexto do judaísmo, o gesto de Jesus lavar os pés dos discípulos, conforme descrito no Evangelho de João 13,1-15, é carregado de um profundo simbolismo e se destaca como um ato radical de humildade e serviço. Para entender o significado desse gesto no judaísmo, é importante considerar algumas práticas e tradições culturais da época.

  1. A Tradição Judaica de Lavar os Pés: No judaísmo do tempo de Jesus, lavar os pés era uma prática comum de hospitalidade. Ao receber um convidado em sua casa, o anfitrião ou um servo lavava os pés do visitante, pois as pessoas se deslocavam usando sandálias em estradas poeirentas. Esse gesto era um sinal de acolhimento e respeito. No entanto, a prática de lavar os pés era vista como uma tarefa reservada aos servos ou escravos, uma vez que era uma função humilde e muitas vezes considerada de baixo status.
  2. A Inversão dos Papéis Sociais: Quando Jesus, como Mestre e Senhor, assume a função de servo ao lavar os pés dos discípulos, Ele desafia diretamente as normas sociais e culturais da época. Ao fazer isso, Jesus inverte a expectativa comum de hierarquia, mostrando que, no Reino de Deus, a verdadeira grandeza se encontra no serviço humilde ao próximo. Essa ação vai contra o entendimento de liderança baseado em poder e status, propondo um modelo de liderança servidora.
  3. O Significado Espiritual: O gesto de lavar os pés também carrega um significado espiritual profundo. Para os discípulos, o ato de Jesus era uma forma de purificação, já que, no contexto religioso judaico, a lavagem era associada à purificação ritual. Embora Jesus não estivesse realizando uma purificação formal, Ele estava simbolicamente limpando os discípulos de sua sujeira espiritual e convidando-os a seguir o Seu exemplo de humildade e serviço.
  4. A Tora e a Humildade: Na tradição judaica, a humildade é uma virtude essencial. Os sábios judaicos ensinavam que a verdadeira grandeza estava na capacidade de servir aos outros com um coração humilde. Ao realizar esse gesto, Jesus se alinha com essa virtude de humildade e serviço, que é central na moral judaica, como exemplificado nos ensinamentos dos profetas e dos mestres da Tora.
  5. A Preparação para a Morte: Além disso, esse gesto de lavar os pés pode ser interpretado como uma preparação simbólica para o sacrifício de Jesus na cruz. Ao servir os discípulos dessa maneira, Ele os prepara para entender o tipo de Messias que Ele é: não um líder militar ou político, mas um Servo Sofredor, disposto a dar Sua vida em favor da humanidade.

Portanto, para o judaísmo, o gesto de Jesus de lavar os pés dos discípulos subverte as normas sociais e religiosas de sua época, chamando todos a praticar uma liderança fundamentada na humildade, no serviço e no amor ao próximo, valores que são centrais na tradição judaica. Além disso, é uma lição sobre a necessidade de purificação interior e um lembrete de que a verdadeira grandeza diante de Deus é medida pela disposição de servir e se humilhar em amor.

Para nós cristãos, o gesto de Jesus de lavar os pés dos discípulos possui uma riqueza de significados que vão além da prática de hospitalidade ou do simples ato de humildade. Esse gesto carrega profundas implicações para a compreensão da natureza de Deus, do Reino de Deus e do chamado dos discípulos para seguir o exemplo de Cristo. Vamos explorar os principais significados teológicos desse ato.

1. O Mistério da Humildade Divina

No gesto de lavar os pés, Jesus, que é o Filho de Deus, revela a profundidade da humildade divina. Ele, sendo Senhor e Mestre, não se impõe sobre os discípulos, mas escolhe servir a eles de maneira concreta e visível. Este gesto nos aponta para a natureza paradoxal de Deus, que é completamente transcendente e, ao mesmo tempo, completamente acessível e servo. A humildade de Jesus é uma característica essencial de Sua divindade. Ele, sendo Deus, não se afasta da humanidade, mas entra nela de maneira radical, demonstrando que o serviço e a doação são centrais para Sua missão redentora.

Esse ato de humildade reflete a “kenosis“, o “despojamento” de Cristo, descrito por Paulo em Filipenses 2,6-8. Ao se esvaziar de Sua glória e se tornar servo, Jesus nos revela que a verdadeira grandeza no Reino de Deus não está em poder ou prestígio, mas em um amor que se faz pequeno e se coloca a serviço dos outros. Jesus, ao lavar os pés, não apenas ensina, mas também revela a essência de Sua identidade como o Servo Sofredor, aquele que está disposto a ir até as últimas consequências por amor.

2. Purificação Espiritual

Este ato de lavar os pés também tem um forte componente de purificação. No contexto bíblico, a lavagem dos pés é associada à purificação, especialmente em rituais de preparação para encontros com Deus ou com momentos sagrados. Quando Jesus lava os pés de Seus discípulos, Ele não está apenas realizando um gesto simbólico de limpeza física, mas está apontando para a purificação interior necessária para uma verdadeira comunhão com Ele. Em João 13,10-11, Jesus explica que aquele que já se purificou precisa apenas lavar os pés, indicando que a lavagem é um reflexo da necessidade de purificação constante na vida espiritual. Este gesto antecipa a purificação final que seria realizada por meio da Sua morte na cruz, que oferece perdão e reconciliação com Deus.

3. O Amor Incondicional e Sacrificial

Ao lavar os pés dos discípulos, Jesus demonstra um amor incondicional e sacrificial, o qual se estende até mesmo àqueles que O traem (Judas) e aos que O abandonam (os discípulos, mais tarde). Esse gesto é uma antecipação do Seu maior ato de amor, a Sua morte na cruz, onde Ele se entregará completamente por toda a humanidade. O ato de lavar os pés dos discípulos não é apenas um exemplo de humildade, mas um sinal visível de Seu amor sacrificial, que se entrega totalmente para a salvação dos outros.

Jesus está mostrando que a verdadeira manifestação do amor de Deus no mundo não é algo grandioso ou grandemente exaltado, mas algo que se manifesta em serviço, sacrifício e doação. O amor de Cristo é aquele que se faz pequeno, que se abaixa, que se humilha por amor ao próximo.

4. Exemplo de Serviço e Liderança no Reino de Deus

Jesus, com este gesto, também redefine o conceito de liderança no Reino de Deus. O mundo tende a ver a liderança como algo que envolve poder, controle e domínio. No entanto, no Reino de Deus, a verdadeira liderança é caracterizada pelo serviço e pela capacidade de servir aos outros. Jesus não exige ser servido, mas escolhe servir, e Ele chama Seus discípulos a seguir esse exemplo.

Em João 13,14-15, Ele instrui os discípulos: “Se eu, o Senhor e Mestre, lavei os pés de vocês, vocês também devem lavar os pés uns dos outros. Pois eu lhes dei o exemplo, para que vocês façam como eu fiz.” Este é um mandamento de serviço mútuo, um convite para que os discípulos se tornem servos uns dos outros, assim como Cristo fez. A liderança cristã não é uma posição de poder ou honra, mas um chamado a servir aos outros com humildade e amor.

5. A Nova Comunhão com Cristo

Teologicamente, o gesto de lavar os pés também pode ser visto como um símbolo da nova comunhão que Jesus estabelece com os Seus seguidores. Ao lavar os pés dos discípulos, Ele não só está purificando-os, mas também os preparando para participar plenamente da Sua vida e missão. O serviço de Jesus vai além do ato físico de lavar os pés; Ele está criando uma nova comunidade fundamentada no serviço mútuo, onde os discípulos são chamados a viver em união e a praticar o amor sacrificial uns com os outros. Essa nova comunhão, fundada na imitação do amor e serviço de Cristo, será a base da Igreja que Ele está estabelecendo.

6. A Preparação para a Morte Redentora

Por fim, o gesto de lavar os pés é uma preparação para o sacrifício de Jesus na cruz. Ele sabe que Sua hora está chegando e usa esse momento para ensinar aos discípulos sobre a verdadeira natureza do Seu sacrifício. A cruz, como o lavatório, será o lugar onde Ele purificará e redimirá a humanidade, mas o gesto de lavar os pés já antecipa o significado profundo do que Ele fará. Assim, esse ato de serviço se torna uma preparação teológica para o ato supremo de amor de Cristo: Sua morte sacrificial, por meio da qual Ele oferece a purificação definitiva para todos os que creem Nele.

Assim, neste gesto, Jesus revela a humildade divina, a purificação necessária para uma vida em Cristo, o amor sacrificial que se entrega sem limites, e redefine a liderança como serviço. Ele também prepara os discípulos para o maior ato de amor, que será a Sua morte na cruz, e estabelece a base para uma nova comunidade de fé, caracterizada pelo amor e serviço mútuo. Em última análise, o gesto de lavar os pés é uma convocação para que todos os discípulos de Cristo sigam Seu exemplo e vivam uma vida de serviço, humildade e amor incondicional.

Memória da Ceia do Senhor: Início do Tríduo Pascal

Na noite em que foi entregue, Jesus celebrou a Ceia com seus discípulos. A comunidade cristã, ao se reunir nesta celebração, faz memória viva do que Ele fez e nos mandou fazer: tomar o pão, dar graças, partir e repartir. Este gesto simples e profundo inaugura o Tríduo Pascal, o coração do ano litúrgico.

Nesta celebração, é essencial preservar a estrutura da Ceia. Nos lugares onde for possível, utilizar-se do pão no lugar da hóstia, preparado especialmente para esta Missa, e não retirado do sacrário, que deve estar vazio desde o início da liturgia. A comunhão é realizada sob as duas espécies, pão e vinho, e a assembleia é convidada a se reunir em torno da mesa do altar, como sinal de unidade e partilha.

A adoração ao Santíssimo Sacramento, que se segue à celebração, ocorre em uma capela à parte, em clima de silêncio e sobriedade. Após a meia-noite, não se faz mais solenidade. Nunca se expõe o Santíssimo em ostensório, nem se deixa o sacrário ou o cibório abertos.

Os cantos que acompanham esta liturgia são próprios: a antífona de entrada, o Glória, as aclamações da oração eucarística e o canto de comunhão. As leituras também são específicas para este momento: o relato da Ceia Pascal do Êxodo, o testemunho mais antigo da Eucaristia presente na segunda leitura, e o Evangelho do Lava-pés, gesto que é repetido na celebração como sinal de serviço e amor fraterno. A cor litúrgica do dia é o branco, símbolo de festa e luz.

Ao final da celebração, o altar principal é desnudado e as imagens e cruzes são cobertas, caso ainda não tenham sido veladas no sábado anterior ao 5º Domingo da Quaresma. As imagens permanecem cobertas até a Vigília Pascal, enquanto a cruz permanece velada até a celebração da Sexta-feira Santa.

Do ponto de vista teológico e litúrgico, esta Ceia marca o início do êxodo pascal de Jesus. Nela, Ele reúne o sentido de toda a sua vida e missão, antecipando o mistério de sua entrega por amor. Celebra-se a Páscoa judaica, memória do êxodo, mas agora Ele mesmo se apresenta como o cordeiro da nova aliança: “Este é o meu corpo… este é o meu sangue”.

Espiritualmente, ao repetir os gestos de Jesus naquela noite, deixamo-nos conduzir pelo mesmo Espírito que o animou. Somos convidados a dedicar nossa vida a uma causa maior, assim como Ele fez. A Eucaristia nos impulsiona à gratidão, a ver o bem mesmo nas dificuldades, e a fazer da própria vida uma entrega total, corpo e sangue, por amor.

Sugestões dos cantos para este dia

Embora as músicas estejam gravadas com o acompanhamento completo de instrumentos, com o objetivo de facilitar o aprendizado e favorecer a adesão melódica, lembramos que o Sagrado Tríduo Pascal exige uma preparação cuidadosa. O uso dos instrumentos deve ser feito com discernimento, respeitando o espírito litúrgico próprio de cada celebração.

Diz o missal romano: Para uma boa celebração do Tríduo sagrado requer-se um número adequado de ministros leigos que devem ter sido cuidadosamente instruídos sobre o que lhes compete fazer.
O canto do povo, dos ministros e do sacerdote que preside, tem peculiar importância nas celebrações destes dias, pois os textos recebem toda a força que lhes é própria, sobretudo quando são cantados.

Orientação do Missal Romano para a Missa Vespertina da Missa da Ceia do Senhor: Durante o hino, tocam-se os sinos, que depois permanecerão silenciosos até o Glória da Vigília pascal, a não ser que o Bispo diocesano determine outra coisa. No mesmo período, o órgão e os outros instrumentos musicais podem ser utilizados somente para sustentar o canto.

Canto de entrada (1ª sugestão): Quanto a nós devemos gloriar-nos
Link: https://www.youtube.com/watch?v=gfPi1qOg0pM&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=3

Canto de entrada (2ª sugestão): Ninguém Pode se Orgulhar (Abertura)
Link: https://www.youtube.com/watch?v=8wHCH2v7a7g&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=2

Glória
Link: https://www.youtube.com/watch?v=ORXy8k0P_Po&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=3

Salmo responsorial:
Link: https://www.youtube.com/watch?v=YG_XP7nD5jI&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=4

Aclamação ao Evangelho:
Link: https://www.youtube.com/watch?v=p3so-f2_5XU&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=5

Lava-pés (1ª opção):
Link: https://www.youtube.com/watch?v=p3so-f2_5XU&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=5

Lava-pés (2ª opção)
Link: https://www.youtube.com/watch?v=XHf3LQjonI8&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=7

Apresentação das oferendas:
Link: https://www.youtube.com/watch?v=2CR4PYMyasQ&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=8

Comunhão (1ª opção):
Link: https://www.youtube.com/watch?v=8PzOzuhfEUA&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=9

Comunhão (2ª opção)
Link: https://www.youtube.com/watch?v=4tq6fCC0FJ8&list=OLAK5uy_kjpAsA3rSKZv42Iai_l6DCuO8nPWt4vaY&index=10

Canto da Transladação do Santíssimo Sacramento:
Link: https://www.youtube.com/watch?v=MsF8cdUK8m4&list=RDMsF8cdUK8m4&start_radio=1&rv=MsF8cdUK8m4

Orientações sobre a transladação (missal romano):

Transladação do Santíssimo Sacramento

Se na mesma igreja não houver a celebração da Paixão do Senhor na sexta-feira seguinte, a Missa se conclui como de costume e o Santíssimo Sacramento é colocado no tabernáculo.

Terminada a oração depois da comunhão, o sacerdote, de pé, põe e abençoa o incenso no turíbulo e, ajoelhado, incensa três vezes o Santíssimo Sacramento. Recebe o véu umeral de cor branca, levanta-se, toma o cibório e o cobre com as extremidades do véu.

Forma-se a procissão da transladação do Santíssimo Sacramento, com tochas e incenso, pela igreja ao lugar da reposição, preparado em alguma parte da igreja ou numa capela convenientemente ornada. À frente vai um ministro leigo com a cruz entre dois outros com castiçais acesos; seguem-se outros levando velas acesas; diante do sacerdote que leva o Santíssimo Sacramento vai o turiferário com o turíbulo fumegante. Durante a procissão canta-se o hino Vamos todos louvar juntos (exceto as duas últimas estrofes) ou outro canto eucarístico.

Vamos todos louvar juntos
o mistério do amor,
pois o preço deste mundo
foi o sangue redentor,
recebido de Maria,
que nos deu o Salvador.

Veio ao mundo por Maria,
foi por nós que ele nasceu.
Ensinou sua doutrina,
com os homens conviveu.
No final de sua vida,
um presente ele nos deu.

Observando a Lei mosaica,
se reuniu com os irmãos.
Era noite. Despedida.
Numa ceia: refeição.
Deu-se aos doze em alimento,
pelas suas próprias mãos.

A Palavra do Deus vivo
transformou o vinho e o pão
no seu sangue e no seu corpo
para a nossa salvação.
O milagre nós não vemos,
basta a fé no coração.

Quando a procissão chega ao local da reposição, o sacerdote, se necessário, com a ajuda do diácono, deposita o cibório no tabernáculo, cuja porta fica aberta. Em seguida coloca incenso no turíbulo e, ajoelhado, incensa o Santíssimo Sacramento enquanto se canta Tão sublime sacramento ou outro canto eucarístico. Depois o diácono ou o próprio sacerdote fecha o tabernáculo.

Tão sublime sacramento
adoremos neste altar,
pois o Antigo Testamento
deu ao Novo seu lugar,
Venha a fé por suplemento
os sentidos completar.

Ao Eterno Pai cantemos
e a Jesus, o Salvador.
Ao Espírito exaltemos,
na Trindade eterno amor.
Ao Deus Uno e Trino demos
a alegria do louvor.

Após algum tempo de adoração silenciosa, o sacerdote e os ministros fazem genuflexão e voltam à sacristia.

Em tempo oportuno retiram-se as toalhas do altar e, se possível, as cruzes da igreja. Convém velar as cruzes que não possam ser retiradas.

Os que participam da Missa vespertina não celebram as vésperas.

Os fiéis sejam exortados a adorarem diante do Santíssimo Sacramento, durante algum tempo da noite, segundo a situação e as circunstâncias do lugar. Contudo, após a meia-noite esta adoração seja feita sem nenhuma solenidade.

COMO CONTAMOS OS DIAS DO TRÍDUO PASCAL?

O Tríduo Pascal é o centro do ano litúrgico cristão, especialmente para os católicos. Nele, celebramos os três momentos mais importantes da fé: a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo. Mas os dias do Tríduo não são contados como os dias comuns do nosso calendário. Eles seguem uma lógica litúrgica e bíblica, baseada na tradição judaica, onde o dia começa ao pôr do sol e não à meia-noite, como fazemos hoje.

A Contagem Litúrgica dos Dias

A Bíblia nos mostra esse modo de contar o tempo já na criação do mundo:

“Houve uma tarde e uma manhã: o primeiro dia.”
(Gênesis 1,5)

Por isso, festas importantes como o Natal (que começa na noite do dia 24) e a Páscoa (que começa com a Vigília Pascal) seguem essa lógica. O mesmo vale para o Tríduo Pascal.

Uma Correção Histórica

Durante a Idade Média, o Tríduo sofreu distorções. A celebração do domingo da Ressurreição deixou de ser vista como parte dele, e o sábado passou a ser chamado de “sábado de aleluia”, perdendo o sentido do “sábado da sepultura”. Para corrigir isso, o Papa Pio XII, motivado pelo movimento de renovação litúrgica, fez importantes reformas:

  • 1951: Reforma da Vigília Pascal
  • 1955: Reforma da Semana Santa

Essas reformas restabeleceram a contagem original do Tríduo: sexta-feira da Paixão, sábado da sepultura e domingo da Ressurreição, com início solene na noite da Quinta-feira Santa. Assim, a Quinta-feira ainda pertence à Quaresma e prepara a entrada no mistério pascal.

Entre outras coisas estabeleceu a hora da missa vespertina da ceia do Senhor [não antes das 17 horas] bem como a hora da vigília, de preferência depois da meia noite de sábado para o domingo. Com isto se restabelecia os dias do tríduo pascal.

O Tríduo Dia a Dia

O Tríduo começa na noite da Quinta-feira Santa, com a Missa da Ceia do Senhor, que recorda a Última Ceia, a instituição da Eucaristia e do sacerdócio. Após a missa, o Santíssimo é levado para um lugar de adoração. O altar é desnudado. E vivemos a “vigília com Jesus”, acompanhando espiritualmente sua entrega até a cruz.

Na sexta-feira, às 15h, celebramos a Paixão do Senhor, com a leitura da Paixão; Adoração da Cruz; e a Comunhão eucarística. Esse é um dia de jejum e abstinência, marcado pelo silêncio e recolhimento.

É um dia de silêncio, oração e espera. A Igreja permanece junto ao sepulcro de Jesus, contemplando sua morte e aguardando a ressurreição. Neste dia, não se celebra Missa. O altar permanece desnudado. Só se distribui a Comunhão como viático (para os enfermos).

É um dia ideal para a oração pessoal e a Liturgia das Horas. A oração comunitária deve ser intensificada, especialmente com o uso da Liturgia das Horas e/ou a sua versão inculturada, o Ofício Divino das Comunidades. A insistência é que se celebre com o povo o Ofício de Leituras na madrugadinha e a Oração da manhã  [ou ofício da manhã e do meio dia].  Tais ofícios celebrados na igreja despojada [não na capela da reposição] oferecem um ambiente contemplativo de vigilância, como as mulheres portadoras dos perfumes [miróforas] à espera da madrugada.

A Vigília, considerada a “mãe de todas as Vigílias”, tem quatro partes:

  1. Celebração da Luz: bênção do fogo novo e proclamação da Páscoa.
  2. Liturgia da Palavra: narração das grandes obras de Deus.
  3. Liturgia Batismal: batismo dos catecúmenos e renovação das promessas batismais.
  4. Liturgia Eucarística: celebração da ressurreição com a comunhão.

Mesmo que seja celebrada antes da meia-noite, esta missa já é liturgicamente o Domingo da Páscoa, a maior festa da fé cristã. O mistério da ressurreição celebrado nessa noite se estende ao Domingo de Páscoa e continua por cinquenta dias até Pentecostes.

Por Que a Igreja Conta os Dias Assim?

Esse modo de contar os dias – de pôr do sol a pôr do sol – vem da tradição judaica, que também influenciou Jesus e os primeiros cristãos. A Páscoa cristã tem suas raízes na Páscoa judaica, que celebra a libertação do povo de Israel. Para os cristãos, essa libertação se cumpre plenamente na morte e ressurreição de Cristo.

A Igreja manteve essa tradição para destacar que:

  • O mistério pascal transcende o tempo.
  • Cada “dia” do Tríduo é uma etapa na vitória de Cristo sobre o pecado e a morte.
  • O movimento das trevas para a luz, da morte para a vida, é central para nossa fé.

E o Concílio Vaticano II? O Concílio Vaticano II (1962-1965) não alterou a forma de contar os dias do Tríduo, mas ajudou a redescobrir seu sentido profundo. A reforma litúrgica enfatizou:

  • A participação ativa dos fiéis.
  • A clareza teológica das celebrações.
  • A adaptação pastoral às comunidades.

Ou seja, manteve-se a contagem tradicional, mas com uma renovada atenção ao significado espiritual e ao envolvimento da comunidade.

VIVER O TRÍDUO PASCAL

Independentemente da contagem dos dias litúrgicos, o mais importante é como vivemos o Tríduo Pascal no coração e na fé. Ele é o centro da vida cristã, um tempo sagrado para mergulhar no mistério da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus. Aqui vão algumas formas de viver esse tempo com profundidade:

Com espírito de recolhimento e oração: durante esses dias, somos convidados a silenciar o coração, reduzir as distrações e criar espaço para contemplar o mistério da salvação. O jejum, o silêncio e a meditação ajudam a entrar no clima próprio do Tríduo.

Participar ativamente das celebrações: Cada celebração tem um sentido único:

  • Quinta-feira Santa: reviver a Última Ceia, a Eucaristia e o mandamento do amor.
  • Sexta-feira Santa: contemplar a cruz, fazer jejum e adorar o mistério da entrega total de Cristo.
  • Sábado Santo: viver a espera em oração, no silêncio do sepulcro.
  • Vigília Pascal: celebrar a vitória da luz sobre as trevas, da vida sobre a morte.
  • Domingo de Páscoa: celebrar com grande solenidade. Eis o dia que o Senhor fez para nós.

– Renovar a fé na Ressurreição: o Tríduo não termina na cruz, mas no túmulo vazio. É tempo de esperança renovada, de proclamar com alegria: “O Senhor ressuscitou verdadeiramente!” Somos convidados a deixar que a vida nova do Ressuscitado transforme o nosso modo de viver.

Viver o amor em gestos concretos: o mandamento de Jesus – “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei” – deve guiar nosso Tríduo. Isso pode significar perdoar, reconciliar-se, servir alguém, ou simplesmente estar presente com compaixão.

Bom caminho nestas celebrações do tríduo pascal!

TRÍDUO PASCAL: CELEBRAÇÃO DA REDENÇÃO E DA VIDA NOVA EM CRISTO

Por Ir. Cidinha Batista, pddm

A celebração da Páscoa é o coração do ano litúrgico e a fonte que nutre a vida de fé da Igreja. No centro dessa experiência está o Tríduo Pascal — a paixão, morte e ressurreição de Jesus — que nos insere no mistério da redenção realizada por Cristo, que, ao morrer, venceu a morte, e ao ressuscitar, nos abriu as portas da vida nova.

O Tríduo Pascal é celebrado em três momentos interligados, formando uma única grande Páscoa: a Páscoa da Ceia, a Páscoa da Cruz e a Páscoa da Ressurreição.

Na Quinta-feira Santa, somos convidados a participar da Ceia do Senhor, sentando-nos à mesa com Jesus para celebrar a libertação de seu povo. É a noite do gesto do lava-pés, em que o Senhor nos ensina o mandamento do amor: “Amem-se uns aos outros como eu os amei” (Jo 13,34). A celebração eucarística desta noite, marcada por profunda comunhão, é seguida por um tempo de adoração, que, segundo as orientações da Igreja, não deve se estender além da meia-noite, preparando o coração e o corpo para a Vigília Pascal.

Na Sexta-feira Santa, a Igreja entra no silêncio da cruz. É a Páscoa do Crucificado. A liturgia deste dia expressa o luto, a indignação diante da injustiça e a solidariedade com os crucificados de nosso tempo. A comunidade se reúne para contemplar a Paixão do Senhor, rezar diante da cruz e renovar seu compromisso com a vida e com a dignidade humana.

A Vigília Pascal, celebrada na noite do Sábado Santo, é a mais importante de todas as vigílias da Igreja. É a celebração da vitória da vida sobre a morte, da ressurreição de Cristo, da realização plena do êxodo. À escuridão do túmulo sucede o anúncio glorioso da ressurreição: “Este é o meu Filho. A morte não o reteve, porque maior é o meu Amor”. É a celebração da libertação dos cristãos da escravidão do pecado e da morte, para participarem da glória dos filhos de Deus (Rm 8,21).

Nessa noite, os ritos litúrgicos — como a procissão luminosa com o Círio Pascal, a renovação das promessas batismais e a Eucaristia — tornam-se sinais vivos do novo êxodo do povo de Deus. A Igreja atravessa simbolicamente as águas do mal para renascer em Cristo, sendo alimentada pelo “novo maná” na travessia do deserto da vida.

A Vigília Pascal culmina no Domingo da Ressurreição e inaugura os cinquenta dias da festa pascal — tempo de alegria intensa, simbolizada pela cor branca, flores, cânticos de glória e aleluia. Durante todo o tempo pascal, o Círio permanece aceso nas celebrações dominicais como sinal da presença do Ressuscitado, e a aspersão da água pode substituir o ato penitencial, relembrando o batismo.

A última semana da Páscoa é dedicada à oração pela unidade dos cristãos. O Tempo Pascal se encerra com a Solenidade de Pentecostes, quando a Igreja celebra o dom do Espírito Santo, plenitude do Mistério Pascal de Cristo.

Feliz e abençoada Páscoa!

DOM ANGÉLICO SÂNDALO BERNARDINO, IJS: UMA VIDA PELO REINO

Com profunda tristeza, recebemos a notícia do falecimento de Dom Angélico Sândalo Bernardino, ocorrido na terça-feira, 15 de abril de 2025, às 18h23, na residência do Padre Antônio Leite Barbosa Júnior. A informação foi confirmada pela Diocese de Blumenau e recebida com grande pesar por todos nós. Estávamos unidos em oração por sua saúde, que havia piorado nas últimas horas. Agora, nos unimos em solidariedade aos seus familiares, amigos e fiéis que caminharam com ele ao longo de sua vida e missão episcopal. Que Deus o acolha em sua misericórdia infinita.

Dom Angélico exerceu seu episcopado com dedicação e firmeza na fé, deixando um legado significativo na história da Igreja no Brasil — como bispo auxiliar de São Paulo e como o primeiro bispo da Diocese de Blumenau, desde sua criação em 2000.

Trajetória de Vida e Ministério

Dom Angélico nasceu em Saltinho (SP), no dia 19 de janeiro de 1933, filho de Duílio Bernardino e Catarina Sândalo Bernardino. Foi batizado no dia 19 de março do mesmo ano, na Igreja do Coração de Jesus, por Frei Evaristo de Santa Úrsula, capuchinho.

Estudou Filosofia em São Paulo (bairro Ipiranga), Jornalismo em Ribeirão Preto e Teologia em Viamão (RS). Foi ordenado presbítero no dia 12 de julho de 1959, na Catedral de São Sebastião, em Ribeirão Preto, por Dom Luiz do Amaral Mousinho. Como sacerdote da Arquidiocese de Ribeirão Preto, desempenhou diversas funções: diretor de jornal, coordenador pastoral, assistente de movimentos eclesiais, cura da catedral e formador no seminário de Brodowski (SP).

Foi nomeado Bispo Auxiliar de São Paulo por São Paulo VI, em 12 de dezembro de 1974, sendo ordenado bispo em 25 de janeiro de 1975, na Catedral da Sé, por Dom Paulo Evaristo Arns. Escolheu como lema episcopal: “Deus é Amor”.

Entre 1975 e 1999, exerceu o episcopado na Arquidiocese de São Paulo, onde foi bispo nas regiões Belém, São Miguel Paulista e Brasilândia; presidiu o Regional Sul 1 da CNBB; atuou na Pastoral Operária; dirigiu o jornal “O São Paulo”; e integrou o Conselho Episcopal Pastoral da CNBB.

Em 19 de abril de 2000, foi nomeado pelo Papa São João Paulo II como o primeiro Bispo Diocesano de Blumenau (SC), tomando posse no dia 24 de junho. Participou do Sínodo da América (Vaticano) e das Conferências de Santo Domingo e Aparecida. Também foi responsável nacional pelo Setor Vocações e Ministérios da CNBB, presidente dos Regionais Sul 1 e Sul 4 e membro da Comissão dos Bispos Eméritos. Em 18 de fevereiro de 2009, teve sua renúncia aceita pelo Papa Bento XVI.

Em sua vida religiosa, ingressou no Instituto Paulino de Vida Secular Consagrada Jesus Sacerdote em 2011. Emitiu os votos perpétuos em 13 de agosto de 2016, após um percurso marcado por dispensas e renovações vocacionais especiais, com autorização da Pia Sociedade de São Paulo.

Velório e Sepultamento

O velório teve início na quarta-feira, 16 de abril, às 8h, na Paróquia Nossa Senhora Aparecida, Vila Zat, região da Brasilândia, em São Paulo. Às 15h, foi celebrada a Missa de corpo presente, presidida pelo Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo. Em seguida, o corpo foi trasladado para Blumenau (SC).

Na quinta-feira, 17 de abril, às 14h, foi celebrada a Santa Missa de exéquias na Catedral de Blumenau, seguida do sepultamento na cripta da Catedral, onde Dom Angélico exerceu seu ministério episcopal.

Palavra da CNBB

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por meio de sua presidência, manifestou profundo pesar pela partida de Dom Angélico:

“Com pesar recebemos a notícia do falecimento deste nosso irmão Dom Angélico Sândalo Bernardino, às portas do Tríduo Pascal. Elevamos a Deus nossa gratidão por sua dedicação e serviços prestados à Igreja e à CNBB. Que este momento litúrgico seja fonte de força e consolo para todos os que sentem sua partida. Acreditando na Ressurreição, desejamos que brilhe para ele a luz eterna.”

— Dom Jaime Spengler, Arcebispo de Porto Alegre (RS), Presidente da CNBB
— Dom João Justino de Medeiros Silva, Arcebispo de Goiânia (GO), 1º Vice-presidente
— Dom Paulo Jackson Nóbrega de Sousa, Arcebispo de Olinda e Recife (PE), 2º Vice-presidente
— Dom Ricardo Hoepers, Bispo Auxiliar de Brasília (DF), Secretário-Geral da CNBB

“Dai-lhe, Senhor, o descanso eterno, e brilhe para ele a vossa luz. Que ele descanse em paz. Amém.”


DOM ANGÉLICO

por Dom Pedro Casaldáliga

Angélico, mas não angelical:
tem a sábia malicia que pede o evangelho.
Sândalo, flor que se cheira, “bonus odor Christi”.
Bernardino, será seguramente por causa de Jesus,
em cujo nome ele aposta a vida.

Paulista de Saltinho,
forjado em Ribeirão Preto,
barriga-verde, em Blumenau,
vermelho sempre o coração imenso.

Jornalista daqueles que sabem decifrar
sinais do Reino em todo acontecido.
Ele fez do “O São Paulo” uma voz militante
e ecumênica.

Tem sido um bom pastor, em pé de Povo,
e um bom profeta contra as ditaduras.
Auxiliar do time glorioso do
São Paulo do Paulo.

Coordenador de pastorais – famílias,
operários, vocações, companheiro dos padres tão queridos,
solidário dos bispos em aperto.
Põe ternura e paixão no ministério e
a pitada de sal nas cerimônias do cargo e da assembleia.
“Traço de união” entre tendências,
reza o seu lema, a maior verdade de todo o evangelho:
“Deus é Amor”.

Angélico, Irmão, muito obrigado por seres como és.
Continua a ser e a aprontar com essa angélica malicia…

Pedroca do Araguaia

do livro: Dom Angélico Sândalo Bernardino, Bispo Profeta dos Pobres e da Justiça (pg.31).

QUARTA-FEIRA DA SEMANA SANTA: O MISTÉRIO DA TRAIÇÃO E A FIDELIDADE DO AMOR

Nesta Quarta-feira da Semana Santa, a liturgia nos convida a mergulhar no coração do mistério da paixão de Cristo. As leituras de hoje traçam um poderoso paralelo entre o sofrimento do justo, a confiança em Deus diante da dor, e a traição vinda de quem está próximo.

1ª Leitura: Isaías 50,4-9a – O Servo Sofredor

No trecho do profeta Isaías, encontramos a figura do Servo Sofredor. Ele é aquele que, mesmo sendo perseguido, insultado e agredido, mantém-se firme na fidelidade a Deus. “Ofereci as costas aos que me batiam e o rosto aos que me arrancavam a barba…” – diz o texto. O Servo não se rebela, não foge. Ele permanece obediente porque confia que Deus é seu auxílio e sua justiça.

Essa imagem antecipa a figura de Jesus, que caminha para a cruz sem resistência, em entrega total ao plano do Pai.

Salmo 68 (69) – O clamor do justo perseguido

O salmista dá voz ao coração ferido do justo. Rejeitado pelos seus, zombado e desprezado, ele se volta a Deus em súplica: “Na tua grande misericórdia, escuta-me, Senhor”. Mesmo na dor, há esperança. Mesmo no abandono, o salmo é um ato de fé. Este lamento expressa a dor de tantos corações humanos que, como o de Cristo, conhecem a rejeição, a solidão e a injustiça.

Evangelho: Mateus 26,14-25 – A traição de Judas

Neste Evangelho, o drama da Paixão ganha um contorno mais sombrio: Judas Iscariotes, um dos Doze, entrega Jesus por trinta moedas de prata. Durante a última ceia, o próprio Jesus anuncia que será traído por alguém do seu convívio mais próximo. É um momento de profunda dor — não apenas pela violência que se aproxima, mas pela ferida da traição vinda de quem caminhou com Ele, ouviu Seus ensinamentos e partilhou da mesma mesa.

“Um de vós vai me trair” (Mt 26,21)

A Ceia, lugar de comunhão e amor, também se torna o palco da revelação. Judas, dominado por suas ambições, não trai Jesus de longe, mas de perto — sentado ao seu lado, partilhando o pão. Esse gesto revela a complexidade do coração humano e sua capacidade de se afastar do bem, mesmo estando tão próximo da verdade.

O Evangelho nos provoca a refletir: quantas vezes, por nossas escolhas e omissões, também traímos o amor de Cristo? Quantas vezes repetimos, como os discípulos: “Senhor, serei eu?”, sem perceber que nossas atitudes já são a resposta?

Mesmo diante da traição, Jesus não se afasta. Ele acolhe, permanece, oferece ao traidor a chance de arrependimento. Seu silêncio é amoroso e cheio de esperança, uma porta ainda aberta para a conversão. Neste tempo que antecede a Páscoa, somos convidados a olhar para dentro de nós. Rever nossos caminhos, purificar as intenções e nos aproximar do Senhor com sinceridade. Que em vez de sermos instrumentos da dor, sejamos sinais de fidelidade. Que, no lugar da dúvida, cultivemos a confiança. “O meu tempo está próximo” (Mt 26,18) — que também se aproxime o nosso tempo de voltar ao essencial e recomeçar com um coração renovado.

Uma reflexão para o nosso caminho

Essas leituras falam diretamente ao nosso coração e à nossa vida. Elas nos convidam a contemplar Jesus, o Servo fiel, que ama até o fim, mesmo diante da traição, do abandono e da violência. Sua resposta não é a fuga, mas a entrega.

Também somos convidados a olhar para dentro de nós:

  • Quantas vezes, como Judas, traímos o amor de Deus por nossos interesses?
  • Será que conseguimos ser fiéis como o Servo de Isaías, mesmo quando sofremos injustamente?
  • Em nossas dores e angústias, conseguimos manter a esperança e rezar com a confiança do salmista?

A Quarta-feira Santa nos prepara para o Tríduo Pascal. É um chamado à conversão sincera, à reflexão sobre nossas escolhas e à confiança em Deus que nunca nos abandona. O silêncio e a mansidão de Jesus não são sinal de fraqueza, mas de um amor mais forte que a morte.

POR QUE JESUS PERMANECE SERENO DIANTE DE TANTA DOR?

Essa é uma pergunta profunda — e essencial para compreendermos não só a paixão de Cristo, mas também o coração da teologia cristã. A serenidade de Jesus diante da dor não é simples resignação ou frieza emocional; é expressão de algo muito mais profundo: a união total da vontade de Jesus com a vontade do Pai.

Vamos explorar isso em alguns pontos teológicos centrais:

✝️ 1. A plena consciência e liberdade de Jesus

Na teologia cristã, especialmente à luz dos Evangelhos e da tradição, Jesus não é uma vítima inconsciente do sofrimento. Ele sabe o que vai acontecer e, mesmo assim, escolhe ir até o fim. “Ninguém tira a minha vida, mas eu a dou por mim mesmo.” (João 10,18)

A serenidade vem do fato de que Jesus age com liberdade total. Ele entrega a própria vida por amor. Seu sofrimento não é um fracasso, mas uma missão abraçada voluntariamente.

🙏 2. A obediência amorosa ao Pai

Em Filipenses 2,8, São Paulo diz que Jesus “humilhou-se, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz”. Aqui está o núcleo da teologia da cruz: Jesus confia plenamente no Pai, mesmo quando tudo parece desabar. Essa confiança gera serenidade.

A serenidade de Jesus nasce da certeza de que o amor do Pai é maior do que qualquer dor. Ele não entende o sofrimento como um fim em si mesmo, mas como parte do caminho de redenção.

💗 3. A solidariedade com o sofrimento humano

Jesus assume o sofrimento do mundo para redimir o ser humano desde dentro. Sua serenidade é também fruto de uma compaixão infinita: Ele carrega a dor de todos nós. É como se dissesse, em silêncio: “Não tenham medo da dor, eu estou aqui com vocês. Eu conheço a vossa cruz.” Ele sofre, mas não se desespera. Sofre, mas não perde o sentido. Sua serenidade é a de quem vê além da dor — vê a glória da ressurreição.

🕊️ 4. A certeza da vitória final

A fé de Jesus no Pai sustenta sua serenidade. Ele sabe que a cruz não é o fim, mas a passagem para a vida plena. A serenidade de Cristo nasce dessa certeza: o amor vencerá. O sofrimento tem um sentido porque está unido à esperança. “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.” (Lucas 23,46) É o grito sereno de quem se entrega por inteiro, sem medo.

🌿 A serenidade de Jesus diante da dor é possível porque:

  • Ele é plenamente livre e consciente;
  • Confia totalmente no amor do Pai;
  • Abraça o sofrimento como missão redentora;
  • Sabe que o amor vencerá, e a cruz se transformará em ressurreição.

A Serenidade de Jesus na Dor: Uma Escola para a Vida Pastoral

À medida que nos aproximamos do coração do mistério pascal, a figura de Jesus, sereno diante da traição, do abandono e da cruz, nos interpela profundamente. Como Ele pode permanecer calmo, sem revolta, sem desespero, mesmo cercado pela dor? Esta pergunta, mais do que teórica, é um chamado à contemplação e à formação interior daqueles que servem à Igreja.

Jesus vive cada instante de sua paixão em profunda comunhão com o Pai. Sua serenidade não vem da ausência de sofrimento, mas de uma certeza interior: “Meu Pai está comigo.”

Para quem atua na pastoral, essa verdade é essencial. O serviço ao Reino muitas vezes nos leva ao desgaste, à frustração e até à solidão. A serenidade de Jesus nos ensina que a paz verdadeira não depende das circunstâncias externas, mas de uma alma alicerçada na oração e na escuta da vontade de Deus.

Formação pastoral começa na intimidade com Deus. A serenidade de Cristo vem também da obediência amorosa. Ele abraça a cruz não por obrigação, mas por amor: amor ao Pai, amor à humanidade. Não se trata de resignação passiva, mas de uma entrega ativa, consciente e cheia de sentido.

Na vida pastoral, também carregamos muitas “cruzes”: incompreensões, limitações, críticas, fadiga. Quando essas cruzes são vividas como oferta de amor, elas não nos esmagam. Ao contrário, nos tornam mais parecidos com o Bom Pastor, que dá a vida por suas ovelhas.

Jesus permanece sereno porque sabe que a cruz não é o fim. Ele vê o que os outros não veem: a luz da ressurreição já despontando no horizonte da dor. Esse olhar de fé é o segredo da paz que não se abala, mesmo em meio à tempestade.

Pastoralmente, é fundamental cultivar esse olhar esperançoso. Diante dos desafios da missão, precisamos aprender com Jesus a discernir o sentido profundo de cada sofrimento, e a confiar que Deus transforma dor em graça, fracasso em fecundidade.

A serenidade de Jesus é um convite claro para quem serve na Igreja:

  • Rezar mais do que fazer. Sem oração, o serviço vira ativismo e cansaço. Com oração, o serviço vira oferta.
  • Confiar mais do que controlar. Quando confiamos que é Deus quem conduz a missão, encontramos paz.
  • Oferecer mais do que reclamar. As dificuldades da pastoral são lugar de santificação, não de murmuração.
  • Esperar mais do que desistir. A semente que morre na terra dará fruto a seu tempo.

A serenidade de Jesus é a serenidade do missionário que sabe por que e para quem vive. Ele sofre, sim, mas não perde o centro. Ele é traído, mas permanece fiel. Ele é rejeitado, mas continua amando.

Que essa paz de Jesus, nascida da oração, da confiança e do amor, seja também a paz de todo agente de pastoral. Que cada um de nós possa, mesmo nas dores do ministério, repetir com Ele: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.”

Que nesta Semana Santa, possamos nos unir ao Cristo fiel e aprender com Ele a caminhar com confiança, mesmo nos momentos mais sombrios.

TERÇA-FEIRA SANTA: ACOMPANHAR JESUS NA LITURGIA

À medida que avançamos, a liturgia da Terça-feira Santa nos convida a mergulhar mais profundamente no mistério da entrega de Jesus. As leituras de hoje revelam, em harmonia, um drama de missão, confiança e traição — e nos chamam a acompanhar o Senhor com o coração atento e fiel.

Em Isaías 49,1-6, ouvimos o chamado do Servo de Deus, escolhido desde o seio materno para ser “luz para as nações”. Ele enfrenta o aparente fracasso de sua missão — “cantei inutilmente, gastei minhas forças sem resultado” —, mas encontra em Deus sua força e recompensa. Esta figura profética se cumpre plenamente em Jesus, que caminha rumo à cruz com fidelidade inabalável, mesmo diante da rejeição e do sofrimento. O texto nos recorda que a verdadeira medida do êxito não está no aplauso do mundo, mas na obediência ao chamado de Deus.

O Salmo 70(71) é a oração de quem confia profundamente, mesmo nas tribulações. “Em vós, Senhor, me refugio” — canta o salmista —, expressando a confiança de quem caminha com Deus desde a juventude. Assim como Jesus que, mesmo traído e abandonado, permanece unido ao Pai, também somos convidados a buscar refúgio em Deus nos momentos de dor, dúvida e solidão.

O Evangelho de João 13,21-33.36-38 nos insere diretamente no clima da Última Ceia. Jesus, profundamente comovido, anuncia a traição de um dos seus. Judas sai da mesa, e João nos diz: “Era noite.” Não apenas no céu, mas também no coração de quem escolhe o caminho da infidelidade. Pedro, por sua vez, promete seguir Jesus até a morte, mas Jesus o adverte: “Tu me negarás três vezes”. As palavras de Jesus não são condenatórias, mas reveladoras da fragilidade humana — e também da misericórdia divina que nunca nos abandona.

Neste dia, a liturgia nos ensina que acompanhar Jesus é mais do que seguir seus passos fisicamente: é partilhar de sua missão, sua entrega, sua fidelidade, mesmo quando tudo parece escuro. É reconhecer que, como Pedro, também podemos falhar, mas somos chamados a recomeçar, com a graça daquele que conhece nossas fraquezas e mesmo assim nos ama.

A Terça-feira Santa nos convida a silenciar, a estar com Jesus na intimidade da Ceia, a olhar para dentro de nós e perguntar: Sou luz ou estou escolhendo a noite? Tenho confiado em Deus ou nas minhas próprias forças? Acompanhar Jesus na liturgia é permitir que essas palavras penetrem o coração e moldem nossa vida.

A Noite como Símbolo da Escuridão Interior

Essa expressão — “Era noite”, presente em João 13,30 — é breve, mas carrega um profundo simbolismo espiritual. No contexto do Evangelho, ela descreve o momento em que Judas sai da Ceia para consumar a traição. Mas, além de indicar o tempo do dia, “noite” aqui tem uma dimensão teológica e espiritual densa, que fala diretamente ao coração dos cristãos.

Na espiritualidade cristã, a noite muitas vezes representa o distanciamento de Deus, a perda de sentido, a confusão, o pecado. Judas não apenas sai fisicamente da presença de Jesus — ele entra espiritualmente na escuridão de suas escolhas. É o momento em que ele fecha o coração à luz, e, ao fazer isso, mergulha na noite mais profunda: a da alma afastada do amor.

“Era noite” — não só do lado de fora, mas dentro dele.

O Caminho Espiritual e a Escolha pela Luz

Para os cristãos, essa frase é um alerta e um convite. Ela nos lembra que o seguimento de Cristo passa por decisões concretas. Toda vez que negamos a verdade, que nos deixamos levar por interesses egoístas, que traímos os valores do Evangelho, também escolhemos a noite. E muitas vezes, essa noite se apresenta de forma sutil: um silêncio conveniente, uma omissão, uma palavra que fere, uma atitude que esfria o amor.

Mas o Evangelho não termina na noite. Jesus, Luz do mundo, enfrenta a noite da traição, do abandono e da cruz, para que nós nunca mais tenhamos que permanecer nela. Ele caminha conosco dentro das nossas noites — e é isso que transforma a escuridão em possibilidade de conversão.

A Noite como Lugar de Escolha e Esperança

Espiritualmente, “era noite” pode ser também o lugar do recomeço. Foi na noite que Pedro prometeu fidelidade e fracassou — mas também foi perdoado. Foi na noite que os discípulos fugiram — mas depois voltaram. A noite pode ser o tempo do erro, mas também pode ser o início de um novo amanhecer, se escolhemos voltar à luz.

“Era noite” é, então, uma frase que provoca o nosso coração:

  • Onde tenho escolhido a escuridão?
  • Que áreas da minha vida precisam ser tocadas pela luz de Cristo?
  • Estou caminhando com Jesus ou saindo às escondidas como Judas?

Na espiritualidade cristã, esta frase nos chama a vigiar o coração, a reconhecer que todos nós somos frágeis como Judas ou Pedro — mas também profundamente amados e chamados à luz.

“Era noite”: quando a humanidade se afasta da Luz

Essa expressão — “Era noite” (Jo 13,30) — quando lida à luz da história da humanidade, ecoa como um diagnóstico doloroso, mas também como um chamado à esperança. Ela não é apenas uma constatação do tempo, mas uma afirmação do estado da alma. Judas sai da presença de Jesus, e a noite cai, como símbolo da escolha pela escuridão. E assim tem sido, tantas vezes, na história humana.

Cada vez que a humanidade escolhe a lógica da guerra em vez do diálogo, a exploração em vez do cuidado, o egoísmo em vez da fraternidade, ela repete esse mesmo gesto de Judas. Sai da Ceia, abandona o lugar da comunhão, do amor partilhado, e mergulha na noite.

A escuridão de conflitos armados, de desigualdades gritantes, de violências contra os mais vulneráveis, e da devastação da criação é, de fato, uma noite espiritual e existencial. É a noite provocada por corações que perderam o rumo da luz, que já não escutam o grito do outro, nem o clamor da terra.

“Era noite” — e ainda é, quando o lucro vale mais do que vidas, quando as bombas falam mais alto que as pontes, quando rios morrem e povos são silenciados.

Mas essa noite não é o fim

O Evangelho de João é profundamente simbólico, e sempre contrapõe luz e trevas. Mas nunca deixa a noite como última palavra. Porque a luz brilha nas trevas, e as trevas não a venceram (Jo 1,5). Mesmo quando a humanidade parece perdida, Deus continua oferecendo sua presença, sua Palavra, sua luz.

Jesus entra na noite, não foge dela. Ele a atravessa — traído, humilhado, crucificado — para redimir a escuridão do mundo com o brilho do amor radical. E esse é o convite para nós: ser pequenas luzes no meio dessa noite global.

Um apelo à consciência e à conversão coletiva

A frase “era noite” também é um espelho que incomoda. Ela nos pergunta:

  • Onde estamos escolhendo a noite como sociedade?
  • Por que ainda naturalizamos a violência, a miséria, a destruição da Terra?
  • Como podemos voltar à mesa da Ceia, onde o amor é servido, e a fraternidade é possível?

A resposta cristã não é o desespero, mas a vigilância ativa, a compaixão comprometida. Somos chamados a ser sentinelas da manhã, aqueles que, mesmo em meio à escuridão, mantêm acesa a chama da esperança.

SEGUNDA-FEIRA DA SEMANA SANTA: ACOMPANHAR JESUS COM A LITURGIA

As leituras de hoje, Segunda-feira da Semana Santa, (Is 42,1-7; Sl 26(27),1.2.3.13-14; Jo 12,1-11) nos convidam a entrar mais profundamente no mistério da missão de Jesus. Estamos diante de um retrato belíssimo do Servo de Deus, que vem para restaurar, consolar e transformar — não com violência, mas com mansidão, fidelidade e justiça.

O Servo e a Justiça (Isaías 42,1-7)
O profeta Isaías apresenta o “Servo do Senhor”, escolhido por Deus, cheio do Espírito, que traz a justiça às nações. Ele não grita nem quebra o caniço rachado — ao contrário, sustenta e restaura. Esse Servo é figura do próprio Cristo, que caminha com firmeza e compaixão, especialmente junto dos que sofrem e estão à margem. Ele vem como luz para as nações e libertador dos que vivem em trevas.

Confiança em Meio às Provações (Salmo 26(27))
O salmista faz eco a essa esperança, proclamando com força: “O Senhor é minha luz e salvação; de quem terei medo?” Mesmo diante de adversários e perigos, ele mantém os olhos fixos em Deus. Essa confiança serena nos prepara para entender o que significa seguir o Cristo: mesmo quando tudo parece escuro, há uma luz que não se apaga.

Perfume de Entrega (João 12,1-11)
No Evangelho, estamos na casa de Lázaro, seis dias antes da Páscoa. Maria unge os pés de Jesus com um perfume caríssimo, gesto de amor, reverência e antecipação de sua morte. Judas critica, mas Jesus defende Maria: ela entendeu que o tempo era de entrega. Esse perfume enche a casa — assim como o amor verdadeiro deixa marcas profundas onde passa.

Curiosamente, esse gesto se contrapõe à frieza dos que já tramavam a morte não só de Jesus, mas também de Lázaro, cujo testemunho se tornara incômodo. A luz brilha, mas nem todos a acolhem.

Por que este gesto se contrapõe à frieza dos que tramavam a morte de Jesus? O gesto de Maria é gratuito, generoso e profundamente íntimo. Ela unge os pés de Jesus com um perfume caríssimo (nardo puro) e os enxuga com os cabelos — um sinal de adoração, humildade e amor sem reservas. Isso não é só um gesto bonito, é uma declaração de quem ela entende quem é Jesus. Ela o honra como Senhor, como alguém por quem vale a pena gastar o melhor.

Já os líderes religiosos e Judas (neste texto, símbolo do cálculo e da hipocrisia) agem movidos por medo, ciúme e autopreservação. Eles não estão dispostos a perder nada — nem poder, nem prestígio, nem segurança. Por isso tramam a morte de Jesus. Onde Maria vê vida e redenção, eles veem ameaça.

Maria valoriza a presença de Jesus; os outros querem eliminá-la. Maria se coloca aos pés de Jesus — posição de discípula, de quem reconhece sua autoridade e quer aprender com Ele. É um momento de presença real, de escuta silenciosa e amorosa.

Por outro lado, os que conspiram contra Jesus (inclusive muitos dos chefes dos judeus mencionados no texto) não suportam essa presença. Ela incomoda, denuncia, desinstala. O gesto de Maria mostra o quanto é possível se aproximar de Jesus; a conspiração mostra o quanto o coração humano pode se fechar para essa presença.

O gesto de Maria antecipa a paixão; os outros se preparam para executá-la. Jesus mesmo diz: “Deixa-a. Ela fez isto em vista do dia da minha sepultura.” Maria, talvez sem compreender tudo, intui que a hora de Jesus se aproxima. Seu gesto de unção antecipa o que virá: a morte, o sepultamento, a entrega total. Ela acompanha Jesus com amor até o fim.

Enquanto isso, os que tramam sua morte estão endurecendo seus corações, apressando os planos de executá-lo. É como se o amor e o ódio caminhassem lado a lado, mas em direções opostas. Maria representa o amor que reconhece e acolhe. Os conspiradores representam o medo que rejeita e destrói.

O gesto de Maria é um ícone do discipulado verdadeiro: entrega, escuta, amor, presença. Ele ilumina a dureza dos corações que preferem o poder à verdade, o controle ao amor. É um lembrete para nós também: em qual grupo estamos? Somos daqueles que, como Maria, se aproximam de Jesus e o honram com tudo o que têm? Ou nos deixamos levar pela lógica do cálculo, da conveniência, do medo?

Caminhar com o Servo
Essas leituras nos colocam num ponto de decisão: seguir o caminho do Servo, confiando em Deus como luz e salvação, ou nos deixar levar pela lógica do poder, do cálculo, da indiferença. Maria escolhe o amor sem medidas. Isaías fala de um servo que não desiste até que a justiça floresça. O salmista escolhe esperar com coragem.

Neste início de Semana Santa, somos convidados a nos deixar perfumar por esse amor que se entrega. Que nossas atitudes também possam “encher a casa” de esperança, serviço e paz.

POR QUE A SEMANA SANTA AINDA IMPORTA EM 2025?

A Semana Santa é o ponto culminante do ano litúrgico da Igreja. Celebrada pelos cristãos do mundo inteiro, ela nos convida a entrar profundamente no mistério central da nossa fé: a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo. Não se trata apenas de recordar um evento passado, mas de vivê-lo liturgicamente, permitindo que a graça da salvação alcance hoje o nosso coração e transforme a nossa vida.

Cada dia da Semana Santa possui um significado especial. O Domingo de Ramos abre as celebrações, recordando a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, acolhido como Rei pelos que dias depois clamariam por sua crucifixão. A liturgia deste dia nos convida a refletir sobre a fragilidade humana e a fidelidade de Cristo.

Na Quinta-feira Santa, a Igreja celebra a instituição da Eucaristia e do sacerdócio, durante a Última Ceia. É também o momento em que Jesus lava os pés dos discípulos, gesto de humildade que nos ensina o caminho do serviço. A celebração se encerra com a transposição simbólica de Jesus ao Horto das Oliveiras, marcando o início de sua Paixão.

A Sexta-feira Santa é o único dia em que não se celebra a Eucaristia. Em silêncio e reverência, os fiéis participam da Celebração da Paixão do Senhor, contemplando a cruz como sinal de amor supremo e redenção. É um dia de jejum, oração e profunda meditação.

O Sábado Santo é marcado pelo silêncio e pela espera. A Igreja permanece em vigília, junto ao túmulo do Senhor, preparando-se para a grande celebração da Vigília Pascal. Na noite do Sábado, a luz do Cristo Ressuscitado rompe as trevas, e a alegria da Ressurreição transforma o luto em júbilo. É a celebração mais importante de todo o ano litúrgico.

Participar da Semana Santa é entrar no coração da fé cristã. É permitir que o amor de Deus, manifestado na Cruz e confirmado na Ressurreição, renove nossa esperança e nos impulsione a viver como discípulos de Cristo no mundo.

Semana Santa

Cronograma da Semana Santa:

📅 Domingo de Ramos da Paixão do Senhor
Evangelho: Mt 21,1-11; Mt 26,14 – 27,66
Jesus é acolhido em Jerusalém como Rei, mas a liturgia já nos conduz ao mistério de sua Paixão.
🕊️ “Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor!” (Mt 21,9)

📅 Segunda-feira Santa
Evangelho: Jo 12,1-11
Jesus é ungido em Betânia. Maria reconhece sua dignidade e se antecipa à sua paixão.
🕊️ “Deixa-a, que ela guarde isto para o dia da minha sepultura.” (Jo 12,7)

📅 Terça-feira Santa
Evangelho: Jo 13,21-33.36-38
Jesus anuncia a traição de Judas e a negação de Pedro.
🕊️ “Antes que o galo cante, tu me negarás três vezes.” (Jo 13,38)

📅 Quarta-feira Santa
Evangelho: Mt 26,14-25
Dia em que Judas Iscariotes trama a traição. Conhecida como a “Quarta-feira das Trevas”.
🕊️ “O Filho do Homem vai morrer, conforme está escrito, mas ai daquele por quem o Filho do Homem é traído!” (Mt 26,24)

📅 Quinta-feira Santa – Ceia do Senhor
Evangelho: Jo 13,1-15
Celebramos a instituição da Eucaristia e do sacerdócio ministerial. Jesus lava os pés dos discípulos, ensinando-nos o amor-serviço.
🕊️ “Eu vos dei o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz a vós.” (Jo 13,15)

📅 Sexta-feira Santa – Paixão do Senhor
Evangelho: Jo 18,1 – 19,42
Dia de jejum, silêncio e veneração da Cruz. A Igreja contempla com reverência o mistério da Cruz de Cristo.
🕊️ “Tudo está consumado.” (Jo 19,30)

📅 Sábado Santo – Vigília Pascal
No silêncio do túmulo, a Igreja espera a Ressurreição. À noite, celebra-se a Vigília Pascal, a “mãe de todas as vigílias”.
🕊️ “Por que estais procurando entre os mortos aquele que está vivo?” (Lc 24,5)

📅 Domingo de Páscoa – Ressurreição do Senhor
Evangelho: Jo 20,1-9
Cristo ressuscitou! A vida venceu a morte, e a esperança renasce no coração dos fiéis.
🕊️ “Ele viu e acreditou.” (Jo 20,8)

Semana Santa: Um Convite à Conversão Profunda

Participar da Semana Santa é mais do que acompanhar rituais religiosos. É permitir que o amor de Deus, manifestado na Cruz e confirmado na Ressurreição, transforme o nosso modo de viver. Como diz São Paulo: “Se com Cristo morremos, com Ele também viveremos.” (Rm 6,8)

A Semana Santa não é apenas uma sucessão de ritos sagrados. Ela é, acima de tudo, um espelho que confronta o nosso interior, uma travessia espiritual que nos convida à conversão – não como um dever moral imposto de fora, mas como um movimento íntimo, necessário e transformador.

Liturgia que nos atravessa

A cada dia da Semana Santa, a liturgia da Igreja nos conduz por cenas profundamente humanas: a aclamação entusiasmada que se transforma em rejeição, a traição que nasce no meio dos amigos, o silêncio de Deus diante do sofrimento inocente, o medo da perda, a fuga dos discípulos, o abandono, o luto… e, enfim, a vida que ressurge quando parecia já não haver saída.

Esses momentos não são apenas memórias do passado. Eles são vividos aqui e agora, em nós. A liturgia nos envolve para que passemos, com Cristo, por esses desertos interiores. Como escreveu Santo Agostinho: “Cristo sofreu por nós para que aprendêssemos a sofrer n’Ele.”

Conversão como travessia

Na teologia cristã, conversão (do latim conversio) significa mudança de direção, retorno a Deus, reencontro com a Verdade. Mas essa virada não é apenas racional. É existencial. A cruz que contemplamos não está apenas sobre o altar: ela revela também nossas contradições, nossas feridas, nossas negações internas.

Ao olhar para Cristo que sofre calado, somos convidados a reconhecer aquilo que em nós resiste ao amor, se fecha ao perdão, se esconde da verdade. A conversão, então, não é medo do castigo, mas coragem de encarar a própria sombra, à luz daquele que tudo redime.

Caminho do autoconhecimento

Sob uma perspectiva psicanalítica, poderíamos dizer que a Semana Santa nos obriga a sair das defesas do ego e nos deparar com conteúdos reprimidos – traições internas, impulsos de fuga, desejos ambivalentes, perdas não elaboradas. Judas, Pedro, Pilatos, Maria, Simão de Cirene… todos representam partes de nós.

A paixão de Cristo é um roteiro profundamente humano. É ali que percebemos como o inconsciente atua nos grandes dilemas: entre amor e medo, entre entrega e controle, entre confiança e autossabotagem. Converter-se, portanto, é também integrar, reconhecer o que em nós precisa ser reconciliado.

A cruz como lugar de reconciliação

No ponto culminante da Semana Santa — a Cruz — não vemos apenas o sofrimento de um inocente, mas um gesto absoluto de amor e reconciliação. Cristo, ao entregar-se livremente, cura a ruptura entre Deus e a humanidade. E, ao fazê-lo, nos convida a reconciliar também as rupturas dentro de nós: com o outro, com o passado, com Deus, e com aquilo que somos de verdade.

🕊️ “Ele foi ferido por causa de nossas transgressões, esmagado por causa de nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre Ele.” (Is 53,5)

Por que a Semana Santa é um convite à conversão?

Porque ela nos tira da superficialidade.
Porque nos confronta com o essencial.
Porque nos revela que a mudança não é só possível — é necessária.
Porque nos lembra que a morte, quando vivida com amor, gera vida nova.
E porque, ao final da dor, sempre há ressurreição.

Que esta semana sagrada seja vivida com fé, silêncio interior e espírito de conversão, abrindo nosso coração para o grande dom da vida nova em Cristo.


REFERÊNCIAS:

BÍBLIA. Bíblia Sagrada. Tradução da CNBB. 2. ed. Brasília: Edições CNBB, 2008.

RATZINGER, Joseph (Papa Bento XVI). Introdução ao Cristianismo. São Paulo: Loyola, 2005.

RATZINGER, Joseph. O espírito da liturgia. São Paulo: Loyola, 2001.

REVISTA DE LITURGIA. Semana Santa: Paixão e Ressurreição do Senhor. Ano 38, n. 152, mar./abr. 2007. São Paulo: Pias Discípulas do Divino Mestre.

REVISTA DE LITURGIA. Abrir a porta ao mistério e acender as luzes da fé. São Paulo: Pias Discípulas do Divino Mestre, n. 308, mar./abr. 2025.

REVISTA DE LITURGIA. Do livro à Palavra. São Paulo: Pias Discípulas do Divino Mestre, n. 307, jan./fev. 2025.

REVISTA DE LITURGIA. Oração, Missal Romano e experiência de Deus. São Paulo: Pias Discípulas do Divino Mestre, n. 306, nov./dez. 2024.

REVISTA DE LITURGIA. Semana Santa: Paixão e Ressurreição do Senhor. São Paulo: Pias Discípulas do Divino Mestre, n. 152, mar./abr. 2007.

AUGUSTINUS, Aurelius. Confissões. Trad. J. Oliveira Santos. São Paulo: Paulus, 1999.

FREUD, Sigmund. O ego e o id. Trad. José Octávio de Aguiar Abreu. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

JUNG, Carl Gustav. A psicologia da transferência. Petrópolis: Vozes, 2013.

KÜNG, Hans. Ser Cristão. São Paulo: Verus, 2005.

Batistérios e a Arquitetura da Iniciação Cristã: um mergulho simbólico e arquitetônico

A dissertação de mestrado “Batistérios e a Arquitetura da Iniciação Cristã: um percurso histórico-simbólico”, defendida por Maria Jeydjane Lunguinho Gomes no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, apresenta uma densa investigação sobre os espaços batismais cristãos sob o olhar da arquitetura. A pesquisa foi orientada pela Profª Drª Ruth Verde Zein e avaliada pelas professoras Profª Drª Patrícia Pereira Martins (Universidade Presbiteriana Mackenzie) e Prof. Dr. Gabriel dos Santos Frade (Faculdade de Teologia do Mosteiro de São Bento/SP), que compuseram a banca examinadora.

Partindo de uma inquietação surgida no exercício profissional da autora, que atua com projetos de arquitetura religiosa, a dissertação aborda um tema muitas vezes negligenciado nas discussões sobre o espaço litúrgico: os batistérios. Estes espaços, destinados ao rito do batismo – porta de entrada da fé cristã –, têm um profundo valor simbólico, teológico e litúrgico, mas nem sempre recebem o devido cuidado em sua representação arquitetônica. A pesquisa busca, então, resgatar a centralidade desse espaço a partir de um percurso que une teoria e prática, história e contemporaneidade.

Dividida em duas partes principais, a primeira fundamenta-se em aportes teóricos oriundos da antropologia, da história e da liturgia cristã, para discutir o simbolismo do batismo e os elementos que moldam os espaços batismais, como a água, a luz e a geometria. A segunda parte dedica-se à análise de três estudos de caso em igrejas localizadas na América Latina – mais especificamente no Uruguai, México e Brasil – com o objetivo de observar como os conceitos litúrgicos e simbólicos se expressam (ou não) na prática projetual.

A primeira etapa da dissertação percorre o papel dos batistérios desde os primeiros séculos do cristianismo, investigando sua evolução histórica e espacial. Desde as Domus Ecclesiae – casas adaptadas ao culto cristão nos primórdios da fé –, passando pelas grandes basílicas paleocristãs, até as reformas do Concílio Vaticano II (1962-1965), o estudo mostra como os espaços destinados ao batismo acompanharam (e em muitos casos, resistiram a) transformações profundas na teologia e nas práticas eclesiais.

Nesse percurso, elementos simbólicos ganham destaque: a água, símbolo de purificação e renascimento; a luz, representação da iluminação espiritual; e a forma arquitetônica, como expressão visível de um mistério invisível. A autora demonstra como a arquitetura, ao integrar esses elementos, pode contribuir para uma experiência mais profunda e significativa do rito batismal.

Na segunda parte da dissertação, os estudos de caso ilustra redescobrir o sentido do batistério como espaço de iniciação, renascimento e luz. Trata-se de um convite à contemplação e ao projeto: pensar o espaço não apenas como função, mas como linguagem do sagrado.

Ao reunir história, simbolismo e análise arquitetônica, a dissertação de Maria Jeydjane oferece uma contribuição significativa para o campo da arquitetura religiosa, especialmente no que diz respeito à valorização dos ritos iniciáticos dentro do espaço litúrgico. Sua pesquisa propõe um olhar atento e sensível para os batistérios, não como apêndices da arquitetura eclesial, mas como espaços centrais na vida de fé.

Em tempos nos quais a arquitetura muitas vezes é guiada pela funcionalidade imediata, este trabalho nos lembra da importância do símbolo, da beleza e da espiritualidade na composição dos espaços. Ao investigar como o batismo é representado materialmente, a autora nos provoca a refletir sobre como nossas igrejas comunicam — ou silenciam — as verdades mais profundas da fé cristã.

Mais do que uma dissertação acadêmica, o estudo de Maria Jeydjane é uma ponte entre teoria e prática, entre liturgia e arquitetura, entre o passado da tradição cristã e os desafios contemporâneos de projetar o sagrado. Uma leitura fundamental para todos os que se dedicam à arquitetura, à teologia e à renovação da experiência litúrgica.

AONDE ESTÁ O CRISTO NESTAS CAMPANHAS DA FRATERNIDADE?

A Campanha da Fraternidade de 2025, promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), traz como tema “Fraternidade e Ecologia Integral” e o lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Essa escolha reflete a preocupação da Igreja com a preservação do meio ambiente e a construção de relações mais fraternas entre os seres humanos.

A ecologia integral é um conceito que busca valorizar a interdependência entre todos os elementos da criação: seres humanos, natureza e Deus. Ao abordar esse tema, a Campanha da Fraternidade nos convida a refletir sobre a urgência de cuidar da nossa Casa Comum, promovendo uma ecologia integral que conecta a fé cristã com a responsabilidade socioambiental.

O Papa Francisco, na encíclica Laudato Si’, enfatiza a necessidade de uma conversão ecológica que una a dimensão espiritual à prática cotidiana de cuidado com o meio ambiente. Ele nos lembra que “tudo está interligado” e que o clamor da terra é inseparável do clamor dos pobres. Assim, ao promover a ecologia integral, a Campanha da Fraternidade de 2025 nos chama a reconhecer a presença de Cristo em toda a criação e a agir em conformidade com esse reconhecimento.

Além disso, a identidade visual da Campanha deste ano foi cuidadosamente elaborada para refletir essa mensagem. O cartaz apresenta elementos que simbolizam a harmonia entre a humanidade e a natureza, ressaltando a beleza da criação divina e a responsabilidade humana em preservá-la.

Portanto, ao questionarmos “Aonde está o Cristo nestas Campanhas da Fraternidade?”, especialmente na de 2025, encontramos a resposta na centralidade de Cristo como fundamento e inspiração para o cuidado com a criação. Ele está presente no chamado à conversão ecológica, na promoção da justiça socioambiental e na vivência concreta do amor ao próximo e à natureza. Assim, a Campanha da Fraternidade nos convida a reconhecer e a responder ao chamado de Cristo para sermos guardiões responsáveis e amorosos da obra criada por Deus.

Aonde está o Cristo nestas Campanhas da Fraternidade?

É uma pergunta que ecoa com força, especialmente nos tempos atuais, quando tantos questionam as intenções por trás de ações e movimentos da Igreja. Ao longo dos anos, a Campanha da Fraternidade tem sido alvo de críticas, incompreensões e, às vezes, desconfianças. Muitos se perguntam: “Onde está o Cristo nesta campanha?” A resposta, porém, é clara para aqueles que se permitem olhar com o coração atento ao Evangelho: Cristo está no centro de cada Campanha da Fraternidade. Ele está presente em cada tema, em cada gesto concreto, em cada chamado à conversão, à justiça e ao amor ao próximo.

Para entender onde está o Cristo nas Campanhas da Fraternidade, é preciso antes lembrar quem é esse Cristo a quem seguimos. Não é um Cristo apenas espiritualizado, distante das dores humanas, mas o Cristo encarnado, que andou com os pobres, tocou os doentes, defendeu os excluídos, enfrentou as estruturas injustas de seu tempo e nos ensinou a amar não com palavras, mas com gestos concretos de compaixão e justiça. O Cristo do Evangelho não é um conceito, mas uma pessoa viva que age na história — especialmente por meio da sua Igreja.

Desde 1964, quando foi lançada a primeira Campanha da Fraternidade, a proposta sempre foi inspirar a vivência do tempo da Quaresma com profundidade: oração, jejum e esmola, sim, mas também compromisso com a transformação da sociedade à luz do Evangelho. A cada ano, um tema nos convida a olhar com mais atenção para uma dimensão concreta da vida que precisa ser iluminada pela Palavra de Deus. E é exatamente aí que Cristo se revela: onde há sofrimento humano, onde há injustiça, ali está o Cristo crucificado; e onde há ações de amor, justiça, escuta, solidariedade, ali está o Cristo ressuscitado.

As campanhas não têm por objetivo substituir a fé pelo ativismo, mas tornar a fé operante pelo amor, como nos ensina São Paulo (Gl 5,6). Elas são um chamado à coerência entre aquilo que professamos aos domingos e aquilo que vivemos de segunda a sábado. São um convite a transformar nossa oração em ação, e nossa devoção em compromisso. Em outras palavras: a Campanha da Fraternidade nos desafia a viver um cristianismo encarnado.

Quando a campanha trata da fome, por exemplo, Cristo está ali — porque Ele mesmo disse: “Tive fome e me destes de comer” (Mt 25,35). Quando o tema é o cuidado com a casa comum, Cristo está ali — pois Ele é o Verbo por quem todas as coisas foram criadas, e nos chama a sermos bons administradores da criação. Quando a campanha fala sobre políticas públicas, fraternidade, superação da violência, diálogo e cultura de paz, Cristo está presente — porque foi Ele quem disse: “Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9). Cada tema pode parecer, à primeira vista, “social demais” para alguns, mas todos são profundamente evangélicos, pois tocam na dignidade da vida humana e no mandamento do amor.

É importante também recordar que Cristo nos deixou um mandamento: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 13,34). E esse amor não é apenas sentimental. É um amor que age, que se compromete, que serve. A Campanha da Fraternidade é um exercício quaresmal de viver esse amor de maneira concreta e transformadora. É o esforço da Igreja no Brasil para ajudar os fiéis a verem os rostos sofredores de Cristo hoje, em cada irmão e irmã feridos pelas estruturas do pecado social.

Há quem diga que certas campanhas parecem políticas, ideológicas ou “progressistas”. Mas é necessário discernir: a caridade cristã é necessariamente política, no sentido mais nobre da palavra — ou seja, relacionada à vida da polis, da cidade, da sociedade. O Papa Francisco nos lembra constantemente que a fé sem compromisso social é uma fé estéril. Ele mesmo afirma, na Evangelii Gaudium: “Nenhum cristão pode pensar que a preocupação com os pobres é uma missão reservada a alguns. Todos somos chamados a cuidar dos mais frágeis da terra.” E é exatamente isso que a Campanha da Fraternidade tenta despertar.

Portanto, ao perguntarmos “Onde está o Cristo?”, precisamos nos abrir para perceber que Ele está na ação concreta da Igreja que se movimenta com compaixão pelos dramas do povo. Cristo está nas comunidades que se organizam para debater soluções para os problemas sociais. Está nos jovens que são sensibilizados a fazer o bem. Está nos padres e leigos que se doam para formar consciências críticas e solidárias. Está no gesto da criança que compartilha o pouco que tem com o coleguinha da escola. Está no olhar da idosa que reza o terço e depois participa das reuniões para pensar a realidade do bairro.

Cristo está na proposta da Campanha da Fraternidade não como um adereço, mas como o centro. Porque Ele mesmo disse: “O que fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40). A campanha é, assim, um reflexo da presença de Cristo em meio ao povo, um convite para que não celebremos a Páscoa sem antes termos passado pela cruz do compromisso com os irmãos.

Em resumo, o Cristo está na Campanha da Fraternidade porque Ele é a fonte, o caminho e o objetivo de tudo que ela propõe. Que possamos, então, abrir os olhos e o coração para reconhecê-Lo, assim como os discípulos de Emaús, que só perceberam a presença do Ressuscitado ao partir do pão. Que também nós possamos reconhecê-Lo no partir do pão da solidariedade, no partir do pão da justiça e no partir do pão do amor ao próximo.

A Campanha da Fraternidade acaba com o espírito da Quaresma?

Entre tantos comentários que circulam nas comunidades e nas redes sociais durante o período quaresmal, uma dúvida tem ganhado espaço: “A Campanha da Fraternidade acaba com o espírito da Quaresma?” A resposta, com serenidade e clareza, é não. Pelo contrário: a Campanha da Fraternidade aprofunda, amplia e dá carne ao espírito da Quaresma, fazendo com que esse tempo litúrgico se torne ainda mais autêntico, mais encarnado e verdadeiramente cristão.

Mas para compreender essa afirmação, de novo, é preciso, antes, entender o que é a Quaresma e qual o seu verdadeiro espírito.

A Quaresma é o tempo litúrgico de preparação para a Páscoa. São quarenta dias de oração, penitência e caridade. É um convite à conversão, à mudança de vida e à renovação da fé. A Igreja propõe a todos os fiéis três práticas fundamentais: oração, jejum e esmola. Ou seja, não se trata apenas de um tempo de espiritualidade interior, mas também de um tempo de abertura ao outro, de solidariedade, de escuta e reconciliação com Deus, consigo mesmo e com os irmãos.

Mais uma vez, retomando a história da Campanha da Fraternidade que nasce em 1964, vemos que ela surge numa iniciativa da Igreja no Brasil que, longe de esvaziar a Quaresma, foi pensada como um instrumento para viver a Quaresma com profundidade e coerência. Ela é uma proposta concreta de conversão que nos ajuda a ver, julgar e agir à luz da fé. A cada ano, a campanha propõe um tema que toca alguma realidade sofrida ou desafiadora da sociedade e nos convida a refletir, rezar e agir de forma comprometida com o Evangelho.

Em 2025, por exemplo, a Campanha da Fraternidade tem como tema “Fraternidade e Ecologia Integral” e o lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Esse tema não é algo “fora da fé”, mas profundamente bíblico e espiritual. Cuidar da criação é cuidar da obra de Deus. A destruição do meio ambiente, a poluição, o desmatamento e a exploração desenfreada da natureza afetam diretamente os mais pobres e vulneráveis, e ferem o projeto divino de harmonia entre todas as criaturas.

Logo, a pergunta se inverte: como poderíamos viver a Quaresma ignorando essas realidades? Como rezar, jejuar e dar esmola sem nos importar com o clamor da terra e o clamor dos pobres? Como preparar o coração para a Páscoa sem olhar para os irmãos que sofrem e para a criação ferida?

A espiritualidade quaresmal nos convida à conversão integral, e isso inclui uma conversão social e ecológica. O Papa Francisco nos lembra, na encíclica Laudato Si’, que tudo está interligado. Cuidar do meio ambiente é uma forma concreta de amar o próximo e de obedecer ao mandamento de Deus. Portanto, a Campanha da Fraternidade nos oferece uma oportunidade de tornar visível e operante nossa fé.

Infelizmente, algumas críticas surgem por falta de compreensão ou por uma visão reducionista da espiritualidade. A espiritualidade cristã não é fuga do mundo, mas presença transformadora nele. Jesus nos ensinou a ir ao encontro dos que sofrem, a agir com misericórdia, a denunciar o pecado — não só o individual, mas também o social e estrutural. A verdadeira espiritualidade não se fecha em si mesma: ela se torna amor ativo.

A Campanha da Fraternidade, nesse sentido, não concorre com a Quaresma — ela a encarna. Ela traduz em linguagem contemporânea aquilo que os profetas já anunciavam no Antigo Testamento: Deus não se agrada de sacrifícios vazios, mas de um coração convertido, que pratica a justiça, defende os oprimidos e cuida dos necessitados (cf. Is 1,11-17; Am 5,21-24).

Ao participar da Campanha da Fraternidade, o fiel é chamado a viver um jejum mais profundo: não apenas o jejum de alimentos, mas o jejum da indiferença, do egoísmo e da omissão. A oração se amplia: não é só súplica individual, mas intercessão por todos que sofrem. E a esmola se concretiza não apenas na oferta material, mas na doação do tempo, do cuidado e do compromisso.

Em nível comunitário, a Campanha da Fraternidade ajuda as paróquias a viverem a Quaresma em comunhão, debatendo realidades que precisam ser evangelizadas. Ela forma a consciência social dos cristãos e fortalece o laço entre fé e vida. Muitas vezes, desperta vocações para o serviço, inspira projetos sociais e transforma realidades locais — tudo isso como fruto do tempo de conversão.

Por isso, é injusto e equivocado dizer que a Campanha da Fraternidade “acaba” com o espírito da Quaresma. Na verdade, ela o amplia, o concretiza e o renova. É um instrumento precioso da Igreja do Brasil para que não celebremos uma Páscoa abstrata, mas a Páscoa da vida que vence a morte em todas as suas formas — inclusive a morte causada pela injustiça, pela exclusão e pela destruição da criação.

Portanto, acolher a Campanha da Fraternidade é acolher o chamado de Cristo à conversão. É caminhar com Ele pelo deserto da Quaresma, atentos às dores do povo e dispostos a sermos sinais de esperança. É preparar o coração para a verdadeira alegria pascal, aquela que brota de uma vida transformada pelo amor.

Que possamos viver esta Quaresma com profundidade, sabendo que oração e ação caminham juntas, e que a espiritualidade cristã verdadeira não se fecha nas práticas internas, mas se abre ao mundo como luz, sal e fermento do Reino de Deus.


REFERÊNCIAS

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada: tradução da CNBB. Brasília: Edições CNBB, 2008.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB). Campanha da Fraternidade 2025: conheça o tema, a identidade visual e a oração. Brasília: CNBB, 2024. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade-2025-conheca-o-tema-a-identidade-visual-e-a-oracao/. Acesso em: 5 abr. 2025.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB). Campanha da Fraternidade 2025: Fraternidade e Ecologia Integral. “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Brasília: CNBB, 2024. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade-2025-conheca-o-tema-a-identidade-visual-e-a-oracao/. Acesso em: 5 abr. 2025.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CATÓLICA DO BRASIL (ANEC). Campanha da Fraternidade 2025. Brasília: ANEC, 2024. Disponível em: https://anec.org.br/acao/campanha-da-fraternidade-2025/. Acesso em: 5 abr. 2025.

FRANCISCO. Laudato Si’: sobre o cuidado da casa comum. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2015. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html. Acesso em: 5 abr. 2025.