SEGUNDA-FEIRA DA SEMANA SANTA: ACOMPANHAR JESUS COM A LITURGIA

As leituras de hoje, Segunda-feira da Semana Santa, (Is 42,1-7; Sl 26(27),1.2.3.13-14; Jo 12,1-11) nos convidam a entrar mais profundamente no mistério da missão de Jesus. Estamos diante de um retrato belíssimo do Servo de Deus, que vem para restaurar, consolar e transformar — não com violência, mas com mansidão, fidelidade e justiça.

O Servo e a Justiça (Isaías 42,1-7)
O profeta Isaías apresenta o “Servo do Senhor”, escolhido por Deus, cheio do Espírito, que traz a justiça às nações. Ele não grita nem quebra o caniço rachado — ao contrário, sustenta e restaura. Esse Servo é figura do próprio Cristo, que caminha com firmeza e compaixão, especialmente junto dos que sofrem e estão à margem. Ele vem como luz para as nações e libertador dos que vivem em trevas.

Confiança em Meio às Provações (Salmo 26(27))
O salmista faz eco a essa esperança, proclamando com força: “O Senhor é minha luz e salvação; de quem terei medo?” Mesmo diante de adversários e perigos, ele mantém os olhos fixos em Deus. Essa confiança serena nos prepara para entender o que significa seguir o Cristo: mesmo quando tudo parece escuro, há uma luz que não se apaga.

Perfume de Entrega (João 12,1-11)
No Evangelho, estamos na casa de Lázaro, seis dias antes da Páscoa. Maria unge os pés de Jesus com um perfume caríssimo, gesto de amor, reverência e antecipação de sua morte. Judas critica, mas Jesus defende Maria: ela entendeu que o tempo era de entrega. Esse perfume enche a casa — assim como o amor verdadeiro deixa marcas profundas onde passa.

Curiosamente, esse gesto se contrapõe à frieza dos que já tramavam a morte não só de Jesus, mas também de Lázaro, cujo testemunho se tornara incômodo. A luz brilha, mas nem todos a acolhem.

Por que este gesto se contrapõe à frieza dos que tramavam a morte de Jesus? O gesto de Maria é gratuito, generoso e profundamente íntimo. Ela unge os pés de Jesus com um perfume caríssimo (nardo puro) e os enxuga com os cabelos — um sinal de adoração, humildade e amor sem reservas. Isso não é só um gesto bonito, é uma declaração de quem ela entende quem é Jesus. Ela o honra como Senhor, como alguém por quem vale a pena gastar o melhor.

Já os líderes religiosos e Judas (neste texto, símbolo do cálculo e da hipocrisia) agem movidos por medo, ciúme e autopreservação. Eles não estão dispostos a perder nada — nem poder, nem prestígio, nem segurança. Por isso tramam a morte de Jesus. Onde Maria vê vida e redenção, eles veem ameaça.

Maria valoriza a presença de Jesus; os outros querem eliminá-la. Maria se coloca aos pés de Jesus — posição de discípula, de quem reconhece sua autoridade e quer aprender com Ele. É um momento de presença real, de escuta silenciosa e amorosa.

Por outro lado, os que conspiram contra Jesus (inclusive muitos dos chefes dos judeus mencionados no texto) não suportam essa presença. Ela incomoda, denuncia, desinstala. O gesto de Maria mostra o quanto é possível se aproximar de Jesus; a conspiração mostra o quanto o coração humano pode se fechar para essa presença.

O gesto de Maria antecipa a paixão; os outros se preparam para executá-la. Jesus mesmo diz: “Deixa-a. Ela fez isto em vista do dia da minha sepultura.” Maria, talvez sem compreender tudo, intui que a hora de Jesus se aproxima. Seu gesto de unção antecipa o que virá: a morte, o sepultamento, a entrega total. Ela acompanha Jesus com amor até o fim.

Enquanto isso, os que tramam sua morte estão endurecendo seus corações, apressando os planos de executá-lo. É como se o amor e o ódio caminhassem lado a lado, mas em direções opostas. Maria representa o amor que reconhece e acolhe. Os conspiradores representam o medo que rejeita e destrói.

O gesto de Maria é um ícone do discipulado verdadeiro: entrega, escuta, amor, presença. Ele ilumina a dureza dos corações que preferem o poder à verdade, o controle ao amor. É um lembrete para nós também: em qual grupo estamos? Somos daqueles que, como Maria, se aproximam de Jesus e o honram com tudo o que têm? Ou nos deixamos levar pela lógica do cálculo, da conveniência, do medo?

Caminhar com o Servo
Essas leituras nos colocam num ponto de decisão: seguir o caminho do Servo, confiando em Deus como luz e salvação, ou nos deixar levar pela lógica do poder, do cálculo, da indiferença. Maria escolhe o amor sem medidas. Isaías fala de um servo que não desiste até que a justiça floresça. O salmista escolhe esperar com coragem.

Neste início de Semana Santa, somos convidados a nos deixar perfumar por esse amor que se entrega. Que nossas atitudes também possam “encher a casa” de esperança, serviço e paz.