AONDE ESTÁ O CRISTO NESTAS CAMPANHAS DA FRATERNIDADE?

A Campanha da Fraternidade de 2025, promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), traz como tema “Fraternidade e Ecologia Integral” e o lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Essa escolha reflete a preocupação da Igreja com a preservação do meio ambiente e a construção de relações mais fraternas entre os seres humanos.

A ecologia integral é um conceito que busca valorizar a interdependência entre todos os elementos da criação: seres humanos, natureza e Deus. Ao abordar esse tema, a Campanha da Fraternidade nos convida a refletir sobre a urgência de cuidar da nossa Casa Comum, promovendo uma ecologia integral que conecta a fé cristã com a responsabilidade socioambiental.

O Papa Francisco, na encíclica Laudato Si’, enfatiza a necessidade de uma conversão ecológica que una a dimensão espiritual à prática cotidiana de cuidado com o meio ambiente. Ele nos lembra que “tudo está interligado” e que o clamor da terra é inseparável do clamor dos pobres. Assim, ao promover a ecologia integral, a Campanha da Fraternidade de 2025 nos chama a reconhecer a presença de Cristo em toda a criação e a agir em conformidade com esse reconhecimento.

Além disso, a identidade visual da Campanha deste ano foi cuidadosamente elaborada para refletir essa mensagem. O cartaz apresenta elementos que simbolizam a harmonia entre a humanidade e a natureza, ressaltando a beleza da criação divina e a responsabilidade humana em preservá-la.

Portanto, ao questionarmos “Aonde está o Cristo nestas Campanhas da Fraternidade?”, especialmente na de 2025, encontramos a resposta na centralidade de Cristo como fundamento e inspiração para o cuidado com a criação. Ele está presente no chamado à conversão ecológica, na promoção da justiça socioambiental e na vivência concreta do amor ao próximo e à natureza. Assim, a Campanha da Fraternidade nos convida a reconhecer e a responder ao chamado de Cristo para sermos guardiões responsáveis e amorosos da obra criada por Deus.

Aonde está o Cristo nestas Campanhas da Fraternidade?

É uma pergunta que ecoa com força, especialmente nos tempos atuais, quando tantos questionam as intenções por trás de ações e movimentos da Igreja. Ao longo dos anos, a Campanha da Fraternidade tem sido alvo de críticas, incompreensões e, às vezes, desconfianças. Muitos se perguntam: “Onde está o Cristo nesta campanha?” A resposta, porém, é clara para aqueles que se permitem olhar com o coração atento ao Evangelho: Cristo está no centro de cada Campanha da Fraternidade. Ele está presente em cada tema, em cada gesto concreto, em cada chamado à conversão, à justiça e ao amor ao próximo.

Para entender onde está o Cristo nas Campanhas da Fraternidade, é preciso antes lembrar quem é esse Cristo a quem seguimos. Não é um Cristo apenas espiritualizado, distante das dores humanas, mas o Cristo encarnado, que andou com os pobres, tocou os doentes, defendeu os excluídos, enfrentou as estruturas injustas de seu tempo e nos ensinou a amar não com palavras, mas com gestos concretos de compaixão e justiça. O Cristo do Evangelho não é um conceito, mas uma pessoa viva que age na história — especialmente por meio da sua Igreja.

Desde 1964, quando foi lançada a primeira Campanha da Fraternidade, a proposta sempre foi inspirar a vivência do tempo da Quaresma com profundidade: oração, jejum e esmola, sim, mas também compromisso com a transformação da sociedade à luz do Evangelho. A cada ano, um tema nos convida a olhar com mais atenção para uma dimensão concreta da vida que precisa ser iluminada pela Palavra de Deus. E é exatamente aí que Cristo se revela: onde há sofrimento humano, onde há injustiça, ali está o Cristo crucificado; e onde há ações de amor, justiça, escuta, solidariedade, ali está o Cristo ressuscitado.

As campanhas não têm por objetivo substituir a fé pelo ativismo, mas tornar a fé operante pelo amor, como nos ensina São Paulo (Gl 5,6). Elas são um chamado à coerência entre aquilo que professamos aos domingos e aquilo que vivemos de segunda a sábado. São um convite a transformar nossa oração em ação, e nossa devoção em compromisso. Em outras palavras: a Campanha da Fraternidade nos desafia a viver um cristianismo encarnado.

Quando a campanha trata da fome, por exemplo, Cristo está ali — porque Ele mesmo disse: “Tive fome e me destes de comer” (Mt 25,35). Quando o tema é o cuidado com a casa comum, Cristo está ali — pois Ele é o Verbo por quem todas as coisas foram criadas, e nos chama a sermos bons administradores da criação. Quando a campanha fala sobre políticas públicas, fraternidade, superação da violência, diálogo e cultura de paz, Cristo está presente — porque foi Ele quem disse: “Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9). Cada tema pode parecer, à primeira vista, “social demais” para alguns, mas todos são profundamente evangélicos, pois tocam na dignidade da vida humana e no mandamento do amor.

É importante também recordar que Cristo nos deixou um mandamento: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 13,34). E esse amor não é apenas sentimental. É um amor que age, que se compromete, que serve. A Campanha da Fraternidade é um exercício quaresmal de viver esse amor de maneira concreta e transformadora. É o esforço da Igreja no Brasil para ajudar os fiéis a verem os rostos sofredores de Cristo hoje, em cada irmão e irmã feridos pelas estruturas do pecado social.

Há quem diga que certas campanhas parecem políticas, ideológicas ou “progressistas”. Mas é necessário discernir: a caridade cristã é necessariamente política, no sentido mais nobre da palavra — ou seja, relacionada à vida da polis, da cidade, da sociedade. O Papa Francisco nos lembra constantemente que a fé sem compromisso social é uma fé estéril. Ele mesmo afirma, na Evangelii Gaudium: “Nenhum cristão pode pensar que a preocupação com os pobres é uma missão reservada a alguns. Todos somos chamados a cuidar dos mais frágeis da terra.” E é exatamente isso que a Campanha da Fraternidade tenta despertar.

Portanto, ao perguntarmos “Onde está o Cristo?”, precisamos nos abrir para perceber que Ele está na ação concreta da Igreja que se movimenta com compaixão pelos dramas do povo. Cristo está nas comunidades que se organizam para debater soluções para os problemas sociais. Está nos jovens que são sensibilizados a fazer o bem. Está nos padres e leigos que se doam para formar consciências críticas e solidárias. Está no gesto da criança que compartilha o pouco que tem com o coleguinha da escola. Está no olhar da idosa que reza o terço e depois participa das reuniões para pensar a realidade do bairro.

Cristo está na proposta da Campanha da Fraternidade não como um adereço, mas como o centro. Porque Ele mesmo disse: “O que fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40). A campanha é, assim, um reflexo da presença de Cristo em meio ao povo, um convite para que não celebremos a Páscoa sem antes termos passado pela cruz do compromisso com os irmãos.

Em resumo, o Cristo está na Campanha da Fraternidade porque Ele é a fonte, o caminho e o objetivo de tudo que ela propõe. Que possamos, então, abrir os olhos e o coração para reconhecê-Lo, assim como os discípulos de Emaús, que só perceberam a presença do Ressuscitado ao partir do pão. Que também nós possamos reconhecê-Lo no partir do pão da solidariedade, no partir do pão da justiça e no partir do pão do amor ao próximo.

A Campanha da Fraternidade acaba com o espírito da Quaresma?

Entre tantos comentários que circulam nas comunidades e nas redes sociais durante o período quaresmal, uma dúvida tem ganhado espaço: “A Campanha da Fraternidade acaba com o espírito da Quaresma?” A resposta, com serenidade e clareza, é não. Pelo contrário: a Campanha da Fraternidade aprofunda, amplia e dá carne ao espírito da Quaresma, fazendo com que esse tempo litúrgico se torne ainda mais autêntico, mais encarnado e verdadeiramente cristão.

Mas para compreender essa afirmação, de novo, é preciso, antes, entender o que é a Quaresma e qual o seu verdadeiro espírito.

A Quaresma é o tempo litúrgico de preparação para a Páscoa. São quarenta dias de oração, penitência e caridade. É um convite à conversão, à mudança de vida e à renovação da fé. A Igreja propõe a todos os fiéis três práticas fundamentais: oração, jejum e esmola. Ou seja, não se trata apenas de um tempo de espiritualidade interior, mas também de um tempo de abertura ao outro, de solidariedade, de escuta e reconciliação com Deus, consigo mesmo e com os irmãos.

Mais uma vez, retomando a história da Campanha da Fraternidade que nasce em 1964, vemos que ela surge numa iniciativa da Igreja no Brasil que, longe de esvaziar a Quaresma, foi pensada como um instrumento para viver a Quaresma com profundidade e coerência. Ela é uma proposta concreta de conversão que nos ajuda a ver, julgar e agir à luz da fé. A cada ano, a campanha propõe um tema que toca alguma realidade sofrida ou desafiadora da sociedade e nos convida a refletir, rezar e agir de forma comprometida com o Evangelho.

Em 2025, por exemplo, a Campanha da Fraternidade tem como tema “Fraternidade e Ecologia Integral” e o lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Esse tema não é algo “fora da fé”, mas profundamente bíblico e espiritual. Cuidar da criação é cuidar da obra de Deus. A destruição do meio ambiente, a poluição, o desmatamento e a exploração desenfreada da natureza afetam diretamente os mais pobres e vulneráveis, e ferem o projeto divino de harmonia entre todas as criaturas.

Logo, a pergunta se inverte: como poderíamos viver a Quaresma ignorando essas realidades? Como rezar, jejuar e dar esmola sem nos importar com o clamor da terra e o clamor dos pobres? Como preparar o coração para a Páscoa sem olhar para os irmãos que sofrem e para a criação ferida?

A espiritualidade quaresmal nos convida à conversão integral, e isso inclui uma conversão social e ecológica. O Papa Francisco nos lembra, na encíclica Laudato Si’, que tudo está interligado. Cuidar do meio ambiente é uma forma concreta de amar o próximo e de obedecer ao mandamento de Deus. Portanto, a Campanha da Fraternidade nos oferece uma oportunidade de tornar visível e operante nossa fé.

Infelizmente, algumas críticas surgem por falta de compreensão ou por uma visão reducionista da espiritualidade. A espiritualidade cristã não é fuga do mundo, mas presença transformadora nele. Jesus nos ensinou a ir ao encontro dos que sofrem, a agir com misericórdia, a denunciar o pecado — não só o individual, mas também o social e estrutural. A verdadeira espiritualidade não se fecha em si mesma: ela se torna amor ativo.

A Campanha da Fraternidade, nesse sentido, não concorre com a Quaresma — ela a encarna. Ela traduz em linguagem contemporânea aquilo que os profetas já anunciavam no Antigo Testamento: Deus não se agrada de sacrifícios vazios, mas de um coração convertido, que pratica a justiça, defende os oprimidos e cuida dos necessitados (cf. Is 1,11-17; Am 5,21-24).

Ao participar da Campanha da Fraternidade, o fiel é chamado a viver um jejum mais profundo: não apenas o jejum de alimentos, mas o jejum da indiferença, do egoísmo e da omissão. A oração se amplia: não é só súplica individual, mas intercessão por todos que sofrem. E a esmola se concretiza não apenas na oferta material, mas na doação do tempo, do cuidado e do compromisso.

Em nível comunitário, a Campanha da Fraternidade ajuda as paróquias a viverem a Quaresma em comunhão, debatendo realidades que precisam ser evangelizadas. Ela forma a consciência social dos cristãos e fortalece o laço entre fé e vida. Muitas vezes, desperta vocações para o serviço, inspira projetos sociais e transforma realidades locais — tudo isso como fruto do tempo de conversão.

Por isso, é injusto e equivocado dizer que a Campanha da Fraternidade “acaba” com o espírito da Quaresma. Na verdade, ela o amplia, o concretiza e o renova. É um instrumento precioso da Igreja do Brasil para que não celebremos uma Páscoa abstrata, mas a Páscoa da vida que vence a morte em todas as suas formas — inclusive a morte causada pela injustiça, pela exclusão e pela destruição da criação.

Portanto, acolher a Campanha da Fraternidade é acolher o chamado de Cristo à conversão. É caminhar com Ele pelo deserto da Quaresma, atentos às dores do povo e dispostos a sermos sinais de esperança. É preparar o coração para a verdadeira alegria pascal, aquela que brota de uma vida transformada pelo amor.

Que possamos viver esta Quaresma com profundidade, sabendo que oração e ação caminham juntas, e que a espiritualidade cristã verdadeira não se fecha nas práticas internas, mas se abre ao mundo como luz, sal e fermento do Reino de Deus.


REFERÊNCIAS

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada: tradução da CNBB. Brasília: Edições CNBB, 2008.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB). Campanha da Fraternidade 2025: conheça o tema, a identidade visual e a oração. Brasília: CNBB, 2024. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade-2025-conheca-o-tema-a-identidade-visual-e-a-oracao/. Acesso em: 5 abr. 2025.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB). Campanha da Fraternidade 2025: Fraternidade e Ecologia Integral. “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Brasília: CNBB, 2024. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade-2025-conheca-o-tema-a-identidade-visual-e-a-oracao/. Acesso em: 5 abr. 2025.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CATÓLICA DO BRASIL (ANEC). Campanha da Fraternidade 2025. Brasília: ANEC, 2024. Disponível em: https://anec.org.br/acao/campanha-da-fraternidade-2025/. Acesso em: 5 abr. 2025.

FRANCISCO. Laudato Si’: sobre o cuidado da casa comum. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2015. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html. Acesso em: 5 abr. 2025.

CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2025 E QUARESMA: UM CHAMADO URGENTE À CONVERSÃO E AO CUIDADO COM A CRIAÇÃO

A Quaresma é um período de 40 dias que antecede a Páscoa, começando na Quarta-feira de Cinzas e terminando na Quinta-feira Santa. Em 2025, a Quaresma ocorre de 5 de março a 17 de abril. Este tempo é dedicado à reflexão, penitência e conversão, preparando os fiéis para celebrar a ressurreição de Cristo.

No Brasil, a Campanha da Fraternidade é realizada anualmente durante a Quaresma pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em 2025, o tema escolhido é “Fraternidade e Ecologia Integral“, com o lema “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31) (Fonte: cnbb.org.br). Esta campanha convida à reflexão sobre a urgência de cuidar da nossa Casa Comum, promovendo uma ecologia integral que conecta a fé cristã com a responsabilidade socioambiental.

A Campanha da Fraternidade 2025 destaca a Ecologia Integral como um chamado ao cuidado com a criação, unindo dimensões ambientais, sociais e espirituais. O lançamento da campanha ocorreu em Brasília, na Quarta-feira de Cinzas, precedido por uma missa presidida pelo bispo auxiliar de Brasília e secretário-geral da CNBB, Dom Ricardo Hoepers.

Durante a Quaresma, os fiéis são convidados a intensificar a oração, o jejum e a caridade, buscando uma verdadeira conversão do coração. A Campanha da Fraternidade 2025 reforça essa vivência ao chamar a atenção para a necessidade de uma conversão ecológica, promovendo ações concretas em prol da preservação ambiental e da justiça social.

Que esta Quaresma e a Campanha da Fraternidade 2025 nos inspirem a cuidar do meio ambiente e a promover uma ecologia integral, reconhecendo a bondade da criação divina e nossa responsabilidade em preservá-la para as futuras gerações.

Fontes:

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB). Campanha da Fraternidade 2025: Conheça o tema, a identidade visual e a oração. 2024. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade-2025-conheca-o-tema-a-identidade-visual-e-a-oracao. Acesso em: 14 mar. 2025.

ANEC – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CATÓLICA DO BRASIL. Campanha da Fraternidade 2025. 2024. Disponível em: https://anec.org.br/acao/campanha-da-fraternidade-2025. Acesso em: 14 mar. 2025.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS (PUC-CAMPINAS). CNBB lança a Campanha da Fraternidade 2025. 2024. Disponível em: https://www.puc-campinas.edu.br/cnbb-lanca-a-campanha-da-fraternidade-2025. Acesso em: 14 mar. 2025.

QUARESMA: RECEBER O PERFUME DAS NOSSAS CINZAS

“Quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto…” (Mt 6,17)

Na Quarta-feira, dia 05/02/2025, iniciaremos o Tempo da Quaresma. E começamos este período recebendo as cinzas. A Quaresma é um tempo favorável para “ordenar a própria vida” de acordo com o sonho de Deus para a humanidade. Este período litúrgico nos convida a refletir sobre nossas relações mais profundas: com Deus, com os outros, com o mundo e conosco mesmos. A partir das práticas quaresmais da oração, esmola e jejum, somos chamados a analisar e questionar o modo como nos relacionamos, guiados pelo exemplo de Jesus.

Esses três gestos — oração, esmola e jejum — são essenciais para vivermos de forma plena e fecunda a Quaresma. Eles não apenas humanizam, mas também tornam a vida mais leve e cheia de sentido. Eles condensam o propósito da vida cristã: abrir-se aos outros (esmola), mergulhar no mistério de Deus (oração) e ordenar a própria existência (jejum).

É essencial criar um espaço novo no coração e na mente, permitindo que algo novo aconteça dentro de nós. Vividos a partir da identificação com Cristo, esses valores ajudam a esvaziar o “ego” e nos aproximam dos pobres e excluídos. Eles nos convidam à compaixão, à misericórdia, ao exercício do bem, ao acolhimento, ao perdão gratuito e ao cuidado com o que nos cerca. O verdadeiro espírito da Quaresma é deixar que o amor circule em nós e no mundo, gerando vida em abundância. Este não é um gesto pontual, mas um “modo de proceder” permanente, que deve se estender além do período quaresmal.

Quaresmas que Acontecem “Fora do Tempo”

A vida nos traz “quaresmas” em momentos inesperados, que não escolhem datas no calendário. São as quaresmas que chegam quando enfrentamos doenças, crises, rupturas ou lutos. Essas situações nos forçam a atravessar momentos difíceis, mas também nos ensinam sobre nossa limitação, fragilidade e pecado.

Ao recebermos as cinzas na Quarta-feira de Cinzas, não estamos realizando um gesto de tristeza ou derrotismo. Pelo contrário, estamos fazendo uma profissão de fé na força da esperança. Mesmo diante das dificuldades, há uma potência interior que nos permite recomeçar, perdoar, confiar novamente nas pessoas e seguir o caminho da vida com renovada energia. As cinzas, simbolizando a fragilidade da vida humana, não são um fim, mas um convite à renovação e à conversão.

O Valor das Nossas Cinzas

As cinzas que recebemos têm significados diferentes, dependendo de sua origem. Elas podem simbolizar a perda e a destruição, como as cinzas de uma casa destruída pelo fogo, ou podem representar algo mais suave, como as cinzas de uma chaminé em um campo. As cinzas que carregamos sobre nossas cabeças são um lembrete da fragilidade humana: do que perdemos, do que desperdiçamos, do amor que não cultivamos, das indiferenças que alimentamos e dos sonhos que não deixamos florescer.

Mas, mesmo que carreguemos essas cicatrizes, há também um caminho novo diante de nós, uma oportunidade de transformação. As cinzas, no sentido bíblico, não representam destruição, mas sim força, espírito, vida, projeto e renovação. Elas são símbolos de esperança, ressurreição e conversão, tanto de nós mesmos quanto dos outros. A imposição das Cinzas é, assim, um convite à purificação, à renovação e à comunhão.

A Travessia Interior e a Graça de Deus

A finalidade da imposição das Cinzas e das práticas quaresmais (oração, jejum e esmola) é nos ajudar a realizar uma verdadeira “travessia interior”. Não se trata de apenas ajustar superficialmente nossa vida, mas de permitir que a Graça de Deus toque os recantos mais profundos de nosso ser. Jesus nos ensina que “o Pai, que vê o que está escondido, te dará a recompensa” (Mt 6,18). Portanto, precisamos de tempos de silêncio, de espaços especiais, para criar um ambiente que favoreça o encontro verdadeiro com Deus.

Re-descobrir nosso lugar interior é um sinal de maturidade e sabedoria. Esse lugar não se refere ao reconhecimento social ou ao êxito externo, mas ao espaço íntimo onde a Graça de Deus tem liberdade para atuar. Nesse “escondido”, podemos encontrar a paz e a serenidade, e é a partir desse lugar que a transformação profunda começa.

A Mística do Encontro

A oração é um convite para entrar nesse “escondido”, onde encontramos a verdadeira essência de nosso ser e nos encontramos com Deus. Ela não é uma obrigação ou uma imposição, mas uma conversa íntima com o Autor da vida. Orar é buscar o centro, é agir a partir do nosso ser mais profundo, e não de influências externas.

A Quaresma nos oferece a chance de reavivar nossas práticas espirituais e transformar nosso coração. Devemos fazer do nosso coração um espaço de humildade e riqueza, de nossas mãos um gesto de ternura, e de nossos pés um desejo de proximidade e comunhão. Dessa forma, podemos ungir com o azeite da misericórdia e o vinho da fragilidade os feridos que encontramos em nosso caminho.

Reflexão para a Quaresma

Iniciamos este caminho quaresmal com a intenção de nos aproximarmos mais de Deus, buscando transformar nossos gestos em expressão de amor e misericórdia. A Quaresma é uma jornada que nos convida a ir além das camadas exteriores de nossa vida, para alcançar a verdade profunda e essencial que habita em nosso interior.

Que, ao longo deste tempo, possamos ser tocados pela Graça de Deus e encontrar, a cada dia, o verdadeiro significado de nossa caminhada de conversão e renovação.


QUARTA-FEIRA DE CINZAS, Ano C

Leituras:

Jl 2,12-18

Sl 50(51),3-4.5-6a.12-13.14 e 17 (R. cf. 3a)

2Cor 5,20-6,2

Mt 6,1-6.16-18


Campanha da Fraternidade 2025: Fraternidade e Ecologia Integral

No início da Quaresma, a Igreja Católica no Brasil dá início à tradicional Campanha da Fraternidade, um importante momento de reflexão e ação em prol da solidariedade e do bem comum. Em 2025, o tema escolhido para esta campanha é “Fraternidade e Ecologia Integral“, e o lema que norteia as ações e reflexões deste ano é retirado do livro de Gênesis: “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31).

A proposta da Campanha da Fraternidade 2025 é convidar todos os fiéis e a sociedade em geral a refletirem sobre a relação entre a fraternidade humana e a preservação do meio ambiente. A escolha do tema busca destacar a importância de uma abordagem integrada da ecologia, que não só defende a preservação da natureza, mas também considera as dimensões sociais e culturais do cuidado com a criação. Este conceito de “Ecologia Integral” nos chama a atenção para a interdependência entre os seres humanos e o planeta, ressaltando que o bem-estar do ser humano está profundamente ligado ao cuidado com o ambiente em que vive.

A mensagem central da campanha é um convite à conversão ecológica, promovendo a conscientização sobre o impacto das nossas ações no planeta e chamando-nos a viver de forma mais responsável, solidária e harmoniosa com a criação divina. O lema “Deus viu que tudo era muito bom” nos recorda a visão positiva e criativa de Deus sobre o mundo, reforçando a beleza e a perfeição da criação, mas também a nossa responsabilidade em cuidar dela.

Neste tempo de Quaresma, a Igreja convida todos a refletirem sobre como suas escolhas diárias impactam o meio ambiente e a sociedade, estimulando ações concretas que promovam a justiça social, a paz e a preservação da Casa Comum. Que a Campanha da Fraternidade 2025 inspire um compromisso renovado com a vida, com a fraternidade e com a ecologia integral, fazendo com que, como cristãos, sejamos verdadeiros cuidadores da criação de Deus.