SÃO JOSÉ: O PAI TERRENO DE JESUS E EXEMPLO DE FÉ

São José é uma das figuras mais importantes do Cristianismo, reconhecido como o pai terreno de Jesus e esposo da Virgem Maria. Sua vida é um exemplo de humildade, obediência e dedicação à vontade de Deus. Apesar de pouco mencionado nas Escrituras, suas ações falam mais alto do que qualquer palavra, demonstrando a importância do silêncio, do trabalho árduo e da confiança inabalável no Senhor.

A MISSÃO DE SÃO JOSÉ SEGUNDO AS ESCRITURAS

São José aparece nos Evangelhos de Mateus e Lucas, onde é descrito como um homem justo. A Bíblia nos revela que ele era descendente de Davi, cumprindo assim a profecia de que o Messias viria dessa linhagem:

“Jacó gerou José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, que é chamado Cristo.” (Mateus 1,16)

José estava prometido em casamento a Maria quando descobriu que ela estava grávida. No entanto, ao invés de expô-la publicamente, pensou em deixá-la secretamente, demonstrando sua compaixão e retidão. Foi então que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonho e lhe disse:

“José, filho de Davi, não temas receber Maria como tua esposa, porque o que nela foi gerado vem do Espírito Santo.” (Mateus 1,20)

Diante dessa revelação, José não hesitou e aceitou sua missão com fé e coragem. Ele acolheu Maria e cuidou de Jesus como seu próprio filho, assumindo o papel de protetor da Sagrada Família.

A FUGA PARA O EGITO E O CUMPRIMENTO DA PROMESSA DIVINA

Logo após o nascimento de Jesus, José recebeu outro aviso celestial. O rei Herodes, temendo perder seu trono, ordenou a matança de todos os meninos de até dois anos em Belém. Mais uma vez, José foi instruído por um anjo a proteger sua família:

“Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito. Fica lá até que eu te avise, pois Herodes há de procurar o menino para o matar.” (Mateus 2,13)

Obediente, José partiu imediatamente, garantindo a segurança do Salvador do mundo. Sua prontidão e fidelidade à vontade divina demonstram sua grandeza como homem de Deus.

A VIDA OCULTA EM NAZARÉ

ÍCONE DE SÃO JOSÉ AMAZÔNICO por MANOEL NERYS

Após a morte de Herodes, José foi novamente guiado pelo anjo do Senhor para retornar a Israel. Estabeleceu-se em Nazaré, onde Jesus cresceu em sabedoria e graça. Embora a Bíblia não entre em detalhes sobre essa fase da vida de José, sabe-se que ele foi um carpinteiro dedicado, ensinando seu ofício a Jesus e provendo para sua família com dignidade.

“Não é este o filho do carpinteiro?” (Mateus 13,55)

A vida simples de José é um testemunho do valor do trabalho honesto e da importância da família. Ele nos ensina que a santidade pode ser vivida no dia a dia, através da dedicação e do amor ao próximo.

O EXEMPLO DE SÃO JOSÉ PARA OS CRISTÃOS

São José é um modelo para todos os cristãos, especialmente para os pais e trabalhadores. Sua fé inabalável, sua prontidão em obedecer a Deus e seu amor pela família fazem dele um exemplo de virtude. Mesmo sem palavras registradas na Bíblia, sua vida é um sermão de entrega total a Deus.

Na tradição católica, ele é invocado como o padroeiro dos trabalhadores, das famílias e da Igreja Universal. O Papa Francisco, grande devoto de São José, frequentemente destaca sua importância e nos convida a seguir seu exemplo de humildade e confiança em Deus.

O Papa Francisco tem uma grande devoção por São José e frequentemente destaca sua importância na Igreja e na vida dos cristãos. Ele até declarou o Ano de São José (de 8 de dezembro de 2020 a 8 de dezembro de 2021) para celebrar os 150 anos do decreto que o proclamou Padroeiro da Igreja Universal. Além disso, escreveu a carta apostólica Patris Corde (“Com Coração de Pai”), onde reflete sobre o papel de São José na história da salvação.

Principais ensinamentos do Papa Francisco sobre São José:

  1. Pai amoroso e terno
    O Papa enfatiza que São José amou Jesus com um coração de pai, ensinando-lhe valores e cuidando dele com dedicação. Ele o chama de um modelo de ternura e misericórdia.
  2. Exemplo de obediência e fé
    Francisco destaca como José escutava a voz de Deus e obedecia sem hesitação, mesmo diante das dificuldades, como a fuga para o Egito. Ele nos ensina a confiar na providência divina.
  3. Padroeiro dos trabalhadores
    São José é um exemplo para todos os trabalhadores. O Papa sempre menciona a dignidade do trabalho e como José, sendo carpinteiro, sustentou sua família com esforço e honestidade.
  4. O Santo do silêncio e da humildade
    Francisco admira o silêncio de São José. Mesmo sem palavras registradas na Bíblia, suas ações falam alto e mostram a importância da humildade e da escuta atenta a Deus.
  5. Protetor dos fracos e necessitados
    José acolheu Maria e Jesus, protegendo-os com coragem. O Papa vê nele um modelo de cuidado com os vulneráveis, como os refugiados, órfãos e os que sofrem injustiças.
  6. Intercessor nas dificuldades
    O Papa incentiva os fiéis a recorrerem a São José em momentos de necessidade. Ele revelou que sempre tem em sua mesa de trabalho uma imagem de São José dormindo, e coloca bilhetes com pedidos de oração debaixo dela.

Frases do Papa Francisco sobre São José:

  • “Todos podem encontrar em São José um intercessor, um apoio e um guia nos momentos de dificuldade.”
  • “A felicidade de José não está na lógica do sacrifício de si mesmo, mas no dom de si mesmo.”
  • “José nos ensina que ter fé em Deus inclui acreditar que Ele pode agir através de nossos medos, nossas fragilidades, nossas fraquezas.”

O Papa Francisco convida os cristãos a imitarem São José, confiando na providência de Deus e vivendo com humildade, amor e dedicação ao próximo.

CONCLUSÃO

São José nos ensina que a verdadeira grandeza está em servir. Ele foi escolhido para uma das missões mais importantes da história da salvação e cumpriu seu papel com dedicação e amor. Seu silêncio não foi omissão, mas sim um testemunho eloquente de que a obediência a Deus vale mais do que palavras.

Que possamos aprender com ele a confiar plenamente nos desígnios divinos e a buscar a santidade em nossas vidas cotidianas. São José, rogai por nós!

https://espacoorante.piasdiscipulas.org.br/post/3956

PAPA FRANCISCO E AS PIAS DISCÍPULAS DO DIVINO MESTRE

Diante da delicada situação de saúde do Papa Francisco, voltamos nosso olhar para suas palavras dirigidas a nós em 2017, durante o nosso Capítulo Geral. Suas mensagens de encorajamento e seu desejo de bem para nossa congregação continuam a nos inspirar. Movidas por essa lembrança, renovamos nossa fé e reforçamos nossas orações por sua recuperação, pedindo a Deus que lhe conceda força, serenidade e saúde para seguir conduzindo a Igreja com sabedoria e amor.

DISCURSO DO PAPA FRANCISCO
 ÀS PARTICIPANTES NO CAPÍTULO GERAL
DAS PIAS DISCÍPULAS DO DIVINO MESTRE

Sala do Consistório
Segunda-feira, 22 de maio de 2017


Queridas Irmãs!

Dou as minhas boas-vindas a todas vós e saúdo cordialmente a nova Superiora-Geral e as novas Conselheiras. Faço votos para que este tempo forte que é o Capítulo Geral traga abundantes frutos evangélicos à vida do vosso Instituto.

Antes de tudo, frutos de comunhão. Abertas ao Espírito Santo, Mestre da diversidade, da unidade nas diferenças, caminhareis numa comunhão entre vós que respeite a pluralidade, que vos impulsione a tecer incansavelmente a unidade nas legítimas diferenças, considerando também o facto de que estais presentes em diversos países e culturas. «Como consentir a cada um de se exprimir, ser acolhido com os seus dons específicos, tornar-se plenamente corresponsável?» (Carta ap. Às pessoas consagradas, 21 de novembro de 2014, II, 3). Cultivando a atenção e o acolhimento recíproco; praticando a correção fraterna e o respeito pelas irmãs mais débeis; crescendo no espírito do viver juntas; banindo das comunidades as divisões, as invejas, os mexericos; dizendo tudo com franqueza e caridade. Sim, pode-se viver assim. Tudo isto que acabei de mencionar destrói a Congregação.

Frutos de comunhão com os irmãos e as irmãs da Família Paulina. Tendes em comum o sacerdote e fundador, padre Giacomo Alberione, e também a missão: anunciar o Evangelho aos homens e às mulheres do nosso tempo, particularmente no vosso caso, mediante o serviço litúrgico e o cuidado dos sacerdotes. Isto é bonito.

Frutos de comunhão com os outros carismas. É o momento da sinergia de todos os consagrados para acolher as riquezas dos demais carismas e pô-las todas ao serviço da evangelização, permanecendo fiéis à própria identidade. «Ninguém constrói o futuro isolando-se, nem contando apenas com as próprias forças« (ibidem). Por conseguinte, convido-vos a cultivar o diálogo e a comunhão com os outros carismas, e a combater de todos os modos a autorreferencialidade. Não é bom quando um consagrado ou consagrada é autorreferencial, sempre diante do espelho a olhar para si mesmo. É terrível.

Por fim, frutos de comunhão com os homens e as mulheres do nosso tempo. O nosso Deus é o Deus da história e a nossa é uma fé que age na história. Nas dúvidas e nas expetativas dos homens e das mulheres de hoje encontramos indicações importantes para o nosso seguimento de Cristo.

O Capítulo é tempo de escuta do Senhor que nos fala através dos sinais dos tempos; tempo de escuta recíproca e portanto de abertura a quanto o Senhor nos comunica mediante os irmãos; tempo de confronto sereno e sem preconceitos entre os próprios projetos e os dos outros. Tudo isto exige abertura da mente e do coração. Neste sentido o Capítulo é um tempo propício para praticar o espírito do êxodo e da hospitalidade: sair de si mesmo para acolher com alegria a parte de verdade que o outro me comunica e juntos caminhar para a verdade plena, a única que nos torna livres (cf. Jo 8, 32).

Ouvir as irmãs. Penso que um dos apostolados mais importantes hoje é o do ouvido: escutar. Ouvir as irmãs, assim como os homens e as mulheres de hoje, e partilhar com eles: estas atitudes são necessárias para um bom Capítulo e para uma santa vida fraterna em comunidade, em cujo crescimento todos se sentem participantes, todos oferecem e todos recebem. Não vos canseis de vos exercitar continuamente na arte da escuta e da partilha. Neste tempo de grandes desafios, que exigem dos consagrados fidelidade criativa e busca apaixonada, a escuta e a partilha são mais necessárias do que nunca, se quisermos que a nossa vida seja plenamente significativa para nós mesmos e para as pessoas que encontramos.

Para tal finalidade é necessário manter um clima de discernimento, para reconhecer o que pertence ao Espírito e o que lhe é contrário. Diante de nós abre-se um mundo de possibilidades. A cultura na qual estamos imersos apresenta-se-nos todas como válidas, boas, mas se não quisermos ser vítimas da cultura do zapping e, às vezes, de uma cultura de morte, devemos incrementar o habitus do discernimento, formar-nos e formar para o discernimento. Não vos canseis de perguntar pessoal e comunitariamente: «Senhor, o que queres que eu faça?», «o que queres que façamos?».

O Capítulo é também tempo para renovar a docilidade ao Espírito que anima a profecia. Ela é um valor irrenunciável para a vida consagrada, porque é uma forma especial de participação na missão profética de Cristo. Isto inclui o ser audaz e ao mesmo tempo humilde, apaixonado por Deus e pela humanidade, para se tornar porta-voz de Deus contra o mal e contra todo o pecado (cf. Vita consecrata , 84).

Como consagradas vivei, em primeiro lugar, a profecia da alegria. Ela está em primeiro lugar. Em primeiro lugar está a profecia da alegria: a alegria do Evangelho. É uma profecia. Hoje o mundo precisa disto: a alegria que nasce do encontro com Cristo numa vida de oração pessoal e comunitária, na escuta diária da Palavra, no encontro com os irmãos e as irmãs, numa feliz vida fraterna em comunidade, inclusiva da fragilidade e no abraço à carne de Cristo nos pobres. Profetas de uma alegria que nasce do nos sentirmos amados e, porque somos amados, perdoados.

A alegria é uma linda realidade na vida de muitos consagrados, mas é também um grande desafio para todos nós. Um seguimento triste é um triste seguimento! E a alegria autêntica, não autorreferencial nem arrogante, é o testemunho mais credível de uma vida plena (cf. Jo 10, 10), porque nele «transparecem a alegria e a beleza de viver o Evangelho e de seguir Cristo» (Carta ap. Às pessoas consagradas , 21 de novembro de 2014, II, 1).

Ao mesmo tempo, esta alegria que enche os vossos corações e se manifesta nos vossos rostos levar-vos-á a sair rumo às periferias participando da alegria da Igreja que é a evangelização. Mas para fazer isto a alegria deve ser verdadeira, não uma alegria falsificada! Não falsifiqueis a alegria. A evangelização, quando estamos convictos de que Jesus é a Boa Nova, é alegria e felicidade para todos. Esta alegria afasta de nós o cancro da resignação, fruto da preguiça que torna a alma árida. Por favor, irmãs resignadas, não! Alegria. Mas o diabo dirá: «Somos poucas, não temos vocações…». Deste modo, fecha-se a cara, faz-se carranca… e perde-se a alegria, acabando na resignação. Não, não se pode viver assim: a esperança de Jesus Cristo é alegria.

Encorajo-vos também a ser profetas de esperança, com os olhos dirigidos para o futuro, lá onde o Espírito impele, para continuar a fazer convosco grandes coisas (cf. Vita consecrata , 110). Santo Hilário de Poitiers, no seu Comentário aos salmos (118, 15, 7), fazia-se eco de uma pergunta que muitos formulavam e ainda hoje formulam aos cristãos: «Onde está, ó cristãos, a vossa esperança?». Como consagrados sabemos que não podemos ser surdos a esta questão. Como todos os discípulos de Jesus sabemos que a esperança é para nós uma responsabilidade, porque fomos chamados a responder a todos que nos perguntarem a sua razão (cf. 1 Pd 3, 15). A esperança que não desilude não se baseia em números nem em obras, mas n’Aquele para o qual nada é impossível (cf. Lc 1, 37).

Santo Agostinho diz que «só a esperança nos torna propriamente cristãos» (A Cidade de Deus, 6, 9, 5). E noutra obra afirma: «A nossa vida, agora, é esperança, depois será eternidade» (Comentário aos salmos 103, 4, 17). Só a esperança permite que caminhemos na estrada da vida, só ela nos torna capazes de futuro. Jesus Cristo é a nossa esperança (cf. 1 Tm 1, 1): n’Ele depositemos a nossa confiança (cf. 2 Tm 1, 12), e com a força do Espírito Santo podemos ser profetas de esperança.

Com esta confiança e força repito-vos: não vos unais aos profetas de desventura, que fazem muitos danos à Igreja e à vida consagrada; não cedais à tentação da sonolência — como os apóstolos no Getsémani — e do desespero. Fortalecei a vossa vocação de «sentinelas da manhã» (cf. Is 21, 11-12) para poder anunciar aos outros a chegada da aurora. Despertai o mundo, iluminai o futuro! Sempre com o sorriso, a alegria, a esperança.

Obrigado pelo que sois, pelo que fazeis e como o fazeis, também aqui na Cidade do Vaticano. Muito obrigado! Maria nossa Mãe vos proteja com o seu olhar e o Senhor vos abençoe, vos mostre o seu Rosto, vos conceda paz e misericórdia.

Por favor, rezai por mim.


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Fonte:

PAPA FRANCISCO. Discurso do Papa Francisco às Pias Discípulas do Divino Mestre. Vaticano: Libreria Editrice, 22 maio 2017. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2017/may/documents/papa-francesco_20170522_pie-discepole-divin-maestro.html. Acesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO E SEUS ESCRITOS: UM PONTIFICADO DE ESPERANÇA E RENOVAÇÃO

Jorge Mario Bergoglio, mais conhecido como Papa Francisco, nasceu em 17 de dezembro de 1936, em Buenos Aires, Argentina. Filho de imigrantes italianos, cresceu em um ambiente modesto e desde cedo demonstrou interesse pela religião e pelo serviço à comunidade. Em 1958, ingressou na Companhia de Jesus, tornando-se jesuíta. Foi ordenado sacerdote em 1969 e, ao longo dos anos, desempenhou diversas funções na Igreja Católica, incluindo a de arcebispo de Buenos Aires e cardeal. Em 13 de março de 2013, foi eleito o 266º Papa da Igreja Católica, tornando-se o primeiro pontífice latino-americano e o primeiro jesuíta a ocupar o cargo.

Desde o início de seu pontificado, Francisco tem se destacado por seu carisma, simplicidade e forte compromisso com a justiça social. Ele tem abordado questões fundamentais como a pobreza, a ecologia, os direitos humanos e a reforma da própria Igreja. Seu estilo pastoral próximo do povo e seu desejo de diálogo com diferentes culturas e religiões o tornaram uma figura influente e respeitada no cenário global.

AS CARTAS E ENCÍCLICAS DO PAPA FRANCISCO

Ao longo de seu pontificado, o Papa Francisco escreveu diversas cartas e encíclicas que refletem sua visão de mundo e os desafios que a humanidade enfrenta. Seus textos são amplamente lidos e discutidos tanto dentro quanto fora da Igreja, pois oferecem reflexões profundas sobre temas sociais, espirituais e ambientais.

EVANGELII GAUDIUM (A ALEGRIA DO EVANGELHO) – 2013

Publicada poucos meses após sua eleição, esta exortação apostólica trata da missão da Igreja no mundo moderno. Francisco incentiva os fiéis a saírem de suas zonas de conforto e a evangelizarem com alegria e misericórdia. Ele critica o consumismo desenfreado, a exclusão social e a desigualdade econômica, destacando a necessidade de uma Igreja mais próxima dos pobres e marginalizados.

LAUDATO SI’ (LOUVADO SEJA) – 2015

Uma das encíclicas mais impactantes do Papa Francisco, “Laudato Si’” trata da ecologia e do cuidado com a Casa Comum, o planeta Terra. O pontífice alerta para os danos ambientais causados pela atividade humana e pela exploração irresponsável dos recursos naturais. Ele destaca a interconexão entre os problemas ambientais e sociais, chamando líderes e cidadãos do mundo inteiro à responsabilidade ecológica e à busca por um modelo de desenvolvimento sustentável.

AMORIS LAETITIA (A ALEGRIA DO AMOR) – 2016

Essa exortação apostólica trata do amor na família e do matrimônio. Baseada nos debates realizados durante os sínodos sobre a família, o documento enfatiza a importância da compreensão, da misericórdia e do acolhimento dentro das comunidades cristãs. Francisco também aborda questões como o divórcio, a educação dos filhos e os desafios enfrentados pelas famílias contemporâneas.

GAUDETE ET EXSULTATE (ALEGRAI-VOS E EXULTAI) – 2018

Este documento trata do chamado universal à santidade no mundo atual. O Papa explica que a santidade não é um privilégio de poucos, mas um chamado acessível a todos, independentemente da vocação ou estado de vida. Ele alerta contra o perigo do individualismo e do consumismo, ressaltando a necessidade de uma vida de serviço e de amor ao próximo.

FRATELLI TUTTI (TODOS IRMÃOS) – 2020

Publicada em meio à pandemia de COVID-19, “Fratelli Tutti” aborda a fraternidade e a amizade social. Francisco critica a cultura do descarte, o aumento das desigualdades e o fechamento de fronteiras entre os povos. Ele propõe um modelo de sociedade baseado na solidariedade, na inclusão e no diálogo inter-religioso.

CARTA APOSTÓLICA PATRIS CORDE (COM CORAÇÃO DE PAI) – 2020

Dedicada a São José, essa carta apostólica destaca a importância desse santo como modelo de pai, trabalhador e homem justo. Francisco ressalta a humildade e o serviço de São José, convidando os cristãos a aprenderem com sua discrição e confiança em Deus.

DILEXIT NOS – 2024

A mais recente encíclica do Papa Francisco, “Dilexit Nos”, publicada em 2024, aborda o amor redentor de Cristo e sua importância na vida cristã. O Papa destaca a centralidade do amor na missão da Igreja e a necessidade de testemunhar esse amor no mundo contemporâneo. Ele enfatiza o perdão, a reconciliação e a caridade como elementos fundamentais para a construção de uma sociedade mais fraterna e pacífica. “Dilexit Nos” convida os fiéis a refletirem sobre o significado do amor de Deus e sua manifestação nas relações humanas.

O IMPACTO DAS CARTAS DO PAPA FRANCISCO

As cartas e encíclicas do Papa Francisco têm um impacto profundo tanto dentro da Igreja quanto na sociedade em geral. Seus escritos são direcionados não apenas aos católicos, mas a todas as pessoas de boa vontade. Seu estilo acessível e suas reflexões baseadas na realidade contemporânea tornam seus textos fontes de inspiração para líderes políticos, ambientalistas, teólogos e fiéis em todo o mundo.

Francisco busca sempre aproximar a Igreja das pessoas, promovendo um diálogo aberto e acolhedor. Ele desafia as estruturas de poder e propõe uma visão de mundo mais humana e solidária. Sua preocupação com os marginalizados, os pobres e o meio ambiente reflete um compromisso genuíno com a justiça e a paz.

Além de suas encíclicas e exortações apostólicas, o Papa também escreve cartas e mensagens para diferentes ocasiões, como eventos internacionais, congressos religiosos e crises humanitárias. Seus escritos são frequentemente citados em debates sobre políticas públicas, economia e direitos humanos.

O Papa Francisco, desde o início de seu pontificado, tem demonstrado um compromisso inabalável com os valores do Evangelho e com a transformação do mundo em um lugar mais justo e fraterno. Suas cartas e encíclicas são documentos fundamentais para compreender sua visão pastoral e seus esforços em enfrentar os desafios do século XXI.

Seja ao abordar a necessidade de uma Igreja mais missionária, a importância do cuidado com o meio ambiente ou a urgência da fraternidade entre os povos, suas palavras ecoam como um chamado à reflexão e à ação. Em um mundo marcado por divisões e crises, as mensagens do Papa Francisco continuam a inspirar milhões de pessoas na busca por um futuro mais humano e solidário.


Fonte:

Documentos do Papa Francisco:

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium: A Alegria do Evangelho. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2013. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html. Acesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO. Laudato Si’: Sobre o Cuidado da Casa Comum. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2015. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html. Acesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO. Amoris Laetitia: Sobre o Amor na Família. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2016. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20160319_amoris-laetitia.html. Acesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO. Gaudete et Exsultate: Sobre o Chamado à Santidade no Mundo Atual. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20160319_amoris-laetitia.html. Acesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO. Fratelli Tutti: Sobre a Fraternidade e a Amizade Social. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2020. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20201003_enciclica-fratelli-tutti.htmlAcesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO. Patris Corde: Com Coração de Pai. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2020. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_letters/documents/papa-francesco-lettera-ap_20201208_patris-corde.html Acesso em: [19 fev. 2025].

PAPA FRANCISCO. Dilexit Nos. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2024. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/20241024-enciclica-dilexit-nos.html. Acesso em: [19 fev. 2025].

Livros sobre o Papa Francisco:

IVEREIGH, Austen. O Grande Reformador: Francisco e a Construção de um Novo Papado. São Paulo: Planeta, 2015.

VALLELY, Paul. Papa Francisco: O Homem e Sua Missão. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013.

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA O LVIII DIA MUNDIAL DAS COMUNICAÇÕES SOCIAIS

(12 de maio de 2024)


Inteligência artificial e sabedoria do coração: para uma comunicação plenamente humana


Queridos irmãos e irmãs!


A evolução dos sistemas da chamada «inteligência artificial», sobre a qual já me debrucei na recente Mensagem para o Dia Mundial da Paz, está a modificar de forma radical também a informação e a comunicação e, através delas, algumas bases da convivência civil. Trata-se duma mudança que afeta não só aos profissionais, mas a todos. A rápida difusão de maravilhosas invenções, cujo funcionamento e potencialidades são indecifráveis para a maior parte de nós, suscita um espanto que oscila entre entusiasmo e desorientação e põe-nos inevitavelmente diante de questões fundamentais: O que é então o homem, qual é a sua especificidade e qual será o futuro desta nossa espécie chamada homo sapiens na era das inteligências artificiais? Como podemos permanecer plenamente humanos e orientar para o bem a mudança cultural em curso?


A partir do coração


Antes de mais nada, convém limpar o terreno das leituras catastróficas e dos seus efeitos paralisadores. Já há um século Romano Guardini, refletindo sobre a técnica e o homem, convidava a não se inveterar contra o «novo» na tentativa de «conservar um mundo belo condenado a desaparecer». Ao mesmo tempo, porém, com veemência profética advertia: «O nosso posto é no devir. Devemos inserir-nos nele, cada um no seu lugar (…), aderindo honestamente, mas permanecendo sensíveis, com um coração incorruptível, a tudo o que nele houver de destrutivo e não-humano». E concluía: «Trata- se – é verdade – de problemas de natureza técnica, científica e política; mas só podem ser resolvidos passando pelo homem. Deve-se formar um novo tipo humano, dotado duma espiritualidade mais profunda, duma nova liberdade e duma nova interioridade». [1]

Neste tempo que corre o risco de ser rico em técnica e pobre em humanidade, a nossa reflexão só pode partir do coração humano. [2] Somente dotando-nos dum olhar espiritual, apenas recuperando uma sabedoria do coração é que poderemos ler e interpretar a novidade do nosso tempo e descobrir o caminho para uma comunicação plenamente humana. O coração, entendido biblicamente como sede da liberdade e das decisões mais importantes da vida, é símbolo de integridade e de unidade, mas evoca também os afetos, os desejos, os sonhos, e sobretudo é o lugar interior do encontro com Deus. Por isso a sabedoria do coração é a virtude que nos permite combinar o todo com as partes, as decisões com as suas consequências, as grandezas com as fragilidades, o passado com o futuro, o eu com o nós.

Esta sabedoria do coração deixa-se encontrar por quem a busca e deixa-se ver a quem a ama; antecipa-se a quem a deseja e vai à procura de quem é digno dela (cf. Sab 6, 12-16). Está com quem aceita conselho (cf. Pr 13, 10), com quem tem um coração dócil, um coração que escuta (cf. 1 Re 3, 9). É um dom do Espírito Santo, que permite ver as coisas com os olhos de Deus, compreender as interligações, as situações, os acontecimentos e descobrir o seu sentido. Sem esta sabedoria, a existência torna-se insípida, pois é precisamente a sabedoria que dá gosto à vida: a sua raiz latina sapere associa-a ao sabor.

Oportunidade e perigo

Não podemos esperar esta sabedoria das máquinas. Embora o termo inteligência artificial já tenha suplantado o termo mais correto utilizado na literatura científica de machine learning (aprendizagem automática), o próprio uso da palavra «inteligência» é falacioso. É certo que as máquinas têm uma capacidade imensamente maior que os seres humanos de memorizar os dados e relacioná-los entre si, mas compete ao homem, e só a ele, descodificar o seu sentido. Não se trata, pois, de exigir das máquinas que pareçam humanas; mas de despertar o homem da hipnose em que cai devido ao seu delírio de omnipotência, crendo-se sujeito totalmente autónomo e autorreferencial, separado de toda a ligação social e esquecido da sua condição de criatura.

Realmente o homem sempre teve experiência de não se bastar a si mesmo, e procura superar a sua vulnerabilidade valendo-se de todos os meios. Partindo dos primeiros instrumentos pré-históricos, utilizados como prolongamento dos braços, passando pelos meios de comunicação como extensão da palavra, chegamos hoje às máquinas mais sofisticadas que funcionam como auxílio do pensamento. Entretanto cada uma destas realidades pode ser contaminada pela tentação primordial de se tornar como Deus sem Deus (cf. Gen 3), isto é, a tentação de querer conquistar com as próprias forças aquilo que deveria, pelo contrário, acolher como dom de Deus e viver na relação com os outros.

Cada coisa nas mãos do homem torna-se oportunidade ou perigo, segundo a orientação do coração. O próprio corpo, criado para ser lugar de comunicação e comunhão, pode tornar-se instrumento de agressão. Da mesma forma, cada prolongamento técnico do homem pode ser instrumento de amoroso serviço ou de domínio hostil. Os sistemas de inteligência artificial podem contribuir para o processo de libertação da ignorância e facilitar a troca de informações entre diferentes povos e gerações. Por exemplo, podem tornar acessível e compreensível um património enorme de conhecimentos, escrito em épocas passadas, ou permitir às pessoas comunicarem em línguas que lhes são desconhecidas. Mas simultaneamente podem ser instrumentos de «poluição cognitiva», alteração da realidade através de narrações parcial ou totalmente falsas, mas acreditadas – e partilhadas – como se fossem verdadeiras. Basta pensar no problema da desinformação que enfrentamos, há anos, no caso das fake news [3] e que hoje se serve da deep fake, isto é, da criação e divulgação de imagens que parecem perfeitamente plausíveis mas são falsas (já me aconteceu a mim também ser objeto delas), ou mensagensáudio que usam a voz duma pessoa, dizendo coisas que ela própria nunca disse. A simulação, que está na base destes programas, pode ser útil nalguns campos específicos, mas torna-se perversa quando distorce as relações com os outros e com a realidade.

Já desde a primeira vaga de inteligência artificial – a das redes sociais – compreendemos a sua ambivalência, constatando a par das oportunidades também os riscos e as patologias. O segundo nível de inteligências artificiais geradoras marca, indiscutivelmente, um salto qualitativo. Por conseguinte é importante ter a possibilidade de perceber, compreender e regulamentar instrumentos que, em mãos erradas, poderiam abrir cenários negativos. Os algoritmos, como tudo o mais que sai da mente e das mãos do homem, não são neutros. Por isso é necessário prevenir propondo modelos de regulamentação ética para contornar os efeitos danosos, discriminadores e socialmente injustos dos sistemas de inteligência artificial e contrastar a sua utilização para a redução do pluralismo, a polarização da opinião pública ou a construção do pensamento único. Assim reitero aqui a minha exortação à «Comunidade das Nações a trabalhar unida para adotar um tratado internacional vinculativo, que regule o desenvolvimento e o uso da inteligência artificial nas suas variadas formas». [4] Entretanto, como em todo o âmbito humano, não é suficiente a regulamentação.

Crescer em humanidade

Somos chamados a crescer juntos, em humanidade e como humanidade. O desafio que temos diante de nós é realizar um salto de qualidade para estarmos à altura duma sociedade complexa, multiétnica, pluralista, multirreligiosa e multicultural. Cabe a nós questionar-nos sobre o progresso teórico e a utilização prática destes novos instrumentos de comunicação e conhecimento. As suas grandes possibilidades de bem são acompanhadas pelo risco de que tudo se transforme num cálculo abstrato que reduz as pessoas a dados, o pensamento a um esquema, a experiência a um caso, o bem ao lucro, com o risco sobretudo de que se acabe por negar a singularidade de cada pessoa e da sua história, dissolvendo a realidade concreta numa série de dados estatísticos.

A revolução digital pode tornar-nos mais livres, mas certamente não conseguirá fazê-lo se nos prender nos modelos designados hoje como echo chamber (câmara de eco). Nestes casos, em vez de aumentar o pluralismo da informação, corre-se o risco de se perder num pântano anónimo, favorecendo os interesses do mercado ou do poder. Não é aceitável que a utilização da inteligência artificial conduza a um pensamento anónimo, a uma montagem de dados não certificados, a uma desresponsabilização editorial coletiva. A representação da realidade por big data (grandes dados), embora funcional para a gestão das máquinas, implica na realidade uma perda substancial da verdade das coisas, o que dificulta a comunicação interpessoal e corre o risco de danificar a nossa própria humanidade. A informação não pode ser separada da relação existencial: implica o corpo, o situar-se na realidade; pede para correlacionar não apenas dados, mas experiências; exige o rosto, o olhar, a compaixão e ainda a partilha.

Penso na narração das guerras e naquela «guerra paralela» que se trava através de campanhas de desinformação. E penso em tantos repórteres que ficam feridos ou morrem no local em efervescência para nos permitir a nós ver o que viram os olhos deles. Pois só tocando pessoalmente o sofrimento das crianças, das mulheres e dos homens é que poderemos compreender o caráter absurdo das guerras.

A utilização da inteligência artificial poderá proporcionar um contributo positivo no âmbito da comunicação, se não anular o papel do jornalismo no local, antes pelo contrário se o apoiar; se valorizar o profissionalismo da comunicação, responsabilizando cada comunicador; se devolver a cada ser humano o papel de sujeito, com capacidade crítica, da própria comunicação.

Interrogativos de hoje e de amanhã

E surgem, espontâneas, algumas questões: Como tutelar o profissionalismo e a dignidade dos trabalhadores no campo da comunicação e da informação, juntamente com a dos utentes em todo o mundo? Como garantir a interoperabilidade das plataformas? Como fazer com que as empresas que desenvolvem plataformas digitais assumam as suas responsabilidades relativamente ao que divulgam daí tirando os seus lucros, de forma análoga ao que acontece com os editores dos meios de comunicação tradicionais? Como tornar mais transparentes os critérios subjacentes aos algoritmos de indexação e desindexação e aos motores de pesquisa, capazes de exaltar ou cancelar pessoas e opiniões, histórias e culturas? Como garantir a transparência dos processos de informação? Como tornar evidente a paternidade dos escritos e rastreáveis as fontes, evitando o para-vento do anonimato? Como deixar claro se uma imagem ou um vídeo retrata um acontecimento ou o simula? Como evitar que as fontes se reduzam a uma só, a um pensamento único elaborado algoritmicamente? E, ao contrário, como promover um ambiente adequado para salvaguardar o pluralismo e representar a complexidade da realidade? Como podemos tornar sustentável este instrumento poderoso, caro e extremamente energívoro? Como podemos torná-lo acessível também aos países em vias de desenvolvimento? A partir das respostas a estas e outras questões compreenderemos se a inteligência artificial acabará por construir novas castas baseadas no domínio informativo, gerando novas formas de exploração e desigualdade ou se, pelo contrário, trará mais igualdade, promovendo uma informação correta e uma maior consciência da transição de época que estamos a atravessar, favorecendo a escuta das múltiplas carências das pessoas e dos povos, num sistema de informação articulado e pluralista. Dum lado, vemos assomar o espetro duma nova escravidão, do outro uma conquista de liberdade; dum lado, a possibilidade de que uns poucos condicionem o pensamento de todos, do outro a possibilidade de que todos participem na elaboração do pensamento. A resposta não está escrita; depende de nós. Compete ao homem decidir se há de tornar-se alimento para os algoritmos ou nutrir o seu coração de liberdade, sem a qual não se cresce na sabedoria. Esta sabedoria amadurece valorizando o tempo e abraçando as vulnerabilidades.

Cresce na aliança entre as gerações, entre quem tem memória do passado e quem tem visão de futuro. Somente juntos é que cresce a capacidade de discernir, vigiar, ver as coisas a partir do seu termo. Para não perder a nossa humanidade, procuremos a Sabedoria que existe antes de todas as coisas (cf. Sir 1, 4), que, passando através dos corações puros, prepara amigos de Deus e profetas (cf. Sab 7, 27): há de ajudar-nos também a orientar os sistemas da inteligência artificial para uma comunicação plenamente humana.

Roma – São João de Latrão, 24 de janeiro de 2024.

[Francisco]

[1] Cartas do Lago de Como (Brescia 52022), 95-97
[2] Em continuidade com as anteriores Mensagens para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, dedicadas a «encontrar as pessoas onde estão e como são» (2021), «escutar com o ouvido do coração» (2022) e «falar com o coração» (2023).
[3] Cf. Mensagem para o LII Dia Mundial das Comunicações (2018): «“A verdade vos tornará livres” (Jo 8, 32). Fake news e jornalismo de paz».
[4] Mensagem para o LVII Dia Mundial da Paz: 1 de janeiro de 2024, 8

Fonte: PARA O LVIII DIA MUNDIAL DAS COMUNICAÇÕES SOCIAIS

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA O 59º DIA MUNDIAL DE ORAÇÃO PELAS VOCAÇÕES

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO
PARA O 59º DIA MUNDIAL DE ORAÇÃO PELAS VOCAÇÕES

[8 de maio de 2022 – IV Domingo de Páscoa]

«Chamados para construir a família humana»

Queridos irmãos e irmãs!

Nos dias que correm, enquanto continuam a soprar os ventos gélidos da guerra e da opressão e frequentemente testemunhamos fenómenos de polarização, prosseguimos como Igreja o processo sinodal iniciado: sentimos urgente necessidade de caminhar juntos cultivando as dimensões da escuta, participação e partilha. Juntamente com todos os homens e mulheres de boa vontade, queremos contribuir para construir a família humana, curar as suas feridas e projetá-la para um futuro melhor. Nesta perspetiva, para o LIX Dia Mundial de Oração pelas Vocações, desejo refletir convosco sobre o amplo significado da «vocação», no contexto duma Igreja sinodal que se coloca à escuta de Deus e do mundo.

Todos chamados a ser protagonistas da missão

A sinodalidade, o caminhar juntos é uma vocação fundamental para a Igreja e, só neste horizonte, é possível descobrir e valorizar as diversas vocações, carismas e ministérios. Ao mesmo tempo, sabemos que a Igreja existe para evangelizar, saindo de si mesma e espalhando a semente do Evangelho na história. Ora esta missão é possível precisamente colocando em sinergia todas as áreas pastorais e, antes ainda, envolvendo todos os discípulos do Senhor. Com efeito, «em virtude do Batismo recebido, cada membro do Povo de Deus tornou-se discípulo missionário (cf. Mt 28, 19). Cada um dos batizados, independentemente da própria função na Igreja e do grau de instrução da sua fé, é um sujeito ativo de evangelização» (Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium, 120). É preciso acautelar-se da mentalidade que separa sacerdotes e leigos, considerando protagonistas os primeiros e executores os segundos, e levar por diante a missão cristã, conjuntamente, leigos e pastores como único Povo de Deus. Toda a Igreja é comunidade evangelizadora.

Chamados a ser guardiões uns dos outros e da criação

A palavra «vocação» não deve ser entendida em sentido restrito, referindo-a apenas àqueles que seguem o Senhor pelo caminho duma consagração específica. Todos somos chamados a participar na missão de Cristo de reunir a humanidade dispersa e reconciliá-la com Deus. De modo mais geral, cada pessoa humana, antes ainda de viver o encontro com Cristo e abraçar a fé cristã, recebe com o dom da vida um chamamento fundamental: cada um de nós é uma criatura querida e amada por Deus, objeto dum pensamento único e especial d’Ele e somos chamados a desenvolver, ao longo da nossa vida, esta centelha divina que mora no coração de cada homem e mulher, contribuindo para fazer crescer uma humanidade animada pelo amor e mútuo acolhimento. Somos chamados a ser guardiões uns dos outros, a construir laços de concórdia e partilha, a curar as feridas da criação para que não seja destruída a sua beleza. Em suma, tornamo-nos uma família na maravilhosa casa comum da criação, na variedade harmoniosa dos seus elementos. Neste sentido amplo, não só os indivíduos mas também os povos, as comunidades e as agregações dos mais variados géneros têm uma «vocação».

Chamados a acolher o olhar de Deus

Nesta grande vocação comum, insere-se a chamada mais particular que Deus nos dirige, alcançando a nossa existência com o seu Amor e orientando-a para a sua meta definitiva, para uma plenitude que ultrapassa até mesmo o limiar da morte. Assim quis Deus olhar, e olha, para a nossa vida.

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA O 59º DIA MUNDIAL DE ORAÇÃO PELAS VOCAÇÕES

As seguintes palavras são atribuídas a Miguel Ângelo Buonarroti: «No interior de cada bloco de pedra, há uma estátua, cabendo ao escultor a tarefa de a descobrir». Se tal pode ser o olhar do artista, com muito mais razão assim nos vê Deus: naquela jovem de Nazaré, viu a Mãe de Deus; no pescador Simão, filho de Jonas, viu Pedro, a rocha sobre a qual podia construir a sua Igreja; no publicano Levi, entreviu o apóstolo e o evangelista Mateus; em Saulo, cruel perseguidor dos cristãos, viu Paulo, o apóstolo dos gentios. O seu olhar de amor sempre nos alcança, toca, liberta e transforma, fazendo com que nos tornemos pessoas novas.

Esta é a dinâmica de cada vocação: somos alcançados pelo olhar de Deus, que nos chama. A vocação – como aliás a santidade – não é uma experiência extraordinária reservada a poucos. Tal como existem «os santos ao pé da porta» (Francisco, Exort. ap. Gaudete et exsultate, 6-9), assim também a vocação é para todos, porque todos são olhados com amor e chamados por Deus.

Diz um provérbio do Extremo Oriente: «Um sábio, ao olhar o ovo, sabe ver a águia; ao olhar a semente, vislumbra uma grande árvore; ao olhar um pecador, sabe entrever um santo». É assim que Deus nos olha: em cada um de nós, vê potencialidades, às vezes ignoradas por nós mesmos, e atua incansavelmente, ao longo da nossa vida, a fim de as podermos colocar ao serviço do bem comum.

Assim a vocação nasce, graças à arte do Escultor divino que, com as suas «mãos», nos faz sair de nós mesmos, para que se delineie em nós a obra-prima que somos chamados a ser. Particularmente capaz de nos purificar, iluminar e recriar é a Palavra de Deus, que nos liberta do egocentrismo. Coloquemo-nos, pois, à escuta da Palavra, para nos abrirmos à vocação que Deus nos confia! E aprendamos a escutar também os irmãos e irmãs na fé, porque nos seus conselhos e exemplo pode esconder-se a iniciativa de Deus, que nos indica estradas sempre novas a percorrer.

Chamados a responder ao olhar de Deus

O olhar amoroso e criador de Deus alcançou-nos de forma singular em Jesus. Ao falar do jovem rico, o evangelista Marcos observa: «Jesus, fitando nele o olhar, sentiu afeição por ele» (10, 21). O mesmo olhar de Jesus, cheio de amor, pousa sobre cada um de nós. Irmãos e irmãs, deixemo-nos tocar por este olhar e ser levados por Ele para além de nós mesmos! E aprendamos também a olhar de tal modo um para o outro que as pessoas com quem vivemos e as que encontramos – sejam elas quem forem – possam sentir-se acolhidas e descobrir que há Alguém que as olha com amor, convidando-as a desenvolverem todas as suas potencialidades.

A nossa vida muda quando acolhemos este olhar. Tudo se torna um diálogo vocacional entre nós e o Senhor, mas também entre nós e os outros. Um diálogo que, vivido em profundidade, nos faz tornar cada vez mais aquilo que somos: na vocação ao sacerdócio ordenado, ser instrumento da graça e da misericórdia de Cristo; na vocação à vida consagrada, ser louvor de Deus e profecia de nova humanidade; na vocação ao matrimónio, ser dom mútuo e geradores e educadores da vida; em cada vocação e ministério na Igreja, em geral, que nos chama a olhar os outros e o mundo com os olhos de Deus, servir o bem e difundir o amor com as obras e as palavras.

A propósito, desejo mencionar aqui a experiência do Dr. José Gregório Hernández Cisneros. Quando trabalhava como médico em Caracas, na Venezuela, quis tornar-se irmão terceiro franciscano. Mais tarde, pensou em tornar-se monge e sacerdote, mas a saúde não lho permitiu. Compreendeu então que a sua vocação era precisamente a profissão médica, na qual se prodigalizou especialmente a favor dos pobres. E, sem reservas, dedicou-se aos doentes atingidos pela epidemia de gripe chamada «espanhola», que então alastrava pelo mundo. Morreu atropelado por um carro, ao sair duma farmácia aonde fora buscar remédios para uma idosa, sua paciente. Testemunha exemplar do que significa acolher a vocação do Senhor aderindo plenamente à mesma, foi beatificado há um ano.

Convocados para construir um mundo fraterno

Como cristãos, não só somos chamados, isto é, interpelados cada qual pessoalmente por uma vocação, mas também con-vocados. Somos como os ladrilhos dum mosaico, belos já quando vistos um a um, mas só juntos é que formam uma imagem. Brilhamos, cada um e cada uma de nós, como uma estrela no coração de Deus e no firmamento do universo, mas somos chamados a compor constelações que orientem e iluminem o caminho da humanidade, a partir do ambiente onde vivemos. Tal é o mistério da Igreja: na convivência das diferenças, ela é sinal e instrumento daquilo a que toda a humanidade é chamada. Para isso, a Igreja deve tornar-se cada vez mais sinodal: capaz de caminhar unida na harmonia das diversidades, onde todos têm a sua própria contribuição para dar e podem participar ativamente.

Portanto, quando falamos de «vocação», não se trata apenas de escolher esta ou aquela forma de vida, votar a própria existência a um determinado ministério ou seguir o encanto do carisma duma família religiosa, dum movimento ou duma comunidade eclesial; mas trata-se sobretudo de realizar o sonho de Deus, o grande desígnio da fraternidade que Jesus tinha no coração quando pediu ao Pai «que todos sejam um só» (Jo 17, 21). Cada vocação na Igreja e, em sentido largo, também na sociedade, concorre para um objetivo comum: fazer ressoar entre os homens e as mulheres aquela harmonia dos múltiplos e variados dons que só o Espírito Santo sabe realizar. Sacerdotes, consagradas e consagrados, fiéis leigos, caminhemos e trabalhemos juntos, para testemunhar que uma grande família humana unida no amor não é uma utopia, mas o projeto para o qual Deus nos criou!

Rezemos, irmãos e irmãs, para que o Povo de Deus, no meio das dramáticas vicissitudes da história, corresponda cada vez mais a esta vocação. Invoquemos a luz do Espírito Santo, para que cada um e cada uma de nós possa encontrar o respetivo lugar e dar o melhor de si neste grande desígnio!

Roma, São João de Latrão, no IV Domingo de Páscoa, 8 de maio de 2022.

Francisco

Fonte: Vatican News

Via-Sacra: meditações escritas do cárcere

Cinco detentos, uma família vítima de homicídio, a filha de um condenado a prisão perpétua, uma educadora, um juiz corregedor de presídios, a mãe de um presidiário, uma catequista, um sacerdote acusado injustamente, um frade voluntário, um policial, todos ligados à Capelania do Cárcere “Due Palazzi” de Pádua: são os autores das meditações que serão lidas durante a Via-Sacra deste ano, presidida pelo Papa Francisco no adro da Basílica de São Pedro.

“Acompanhar Cristo no Caminho da Cruz, com a voz rouca dos que vivem no mundo carcerário, é uma oportunidade para assistir ao prodigioso duelo entre a Vida e a Morte, descobrindo como os fios do bem se entrelacem inevitavelmente com os fios do mal”. São palavras escritas na introdução das meditações da Via-Sacra publicadas pela Libreria Editrice Vaticana. Os textos, as narrações do capelão do Instituto carcerário “Due Palazzi” de Pádua, padre Marco Pozza, e da voluntária Tatuana Mario, foram escritos por eles mesmos, mas pretendem dar voz a todos os que compartilham a mesma condição no mundo inteiro.

Confira o texto integral das meditações: https://is.gd/vrEHWj

Texto: Vaticano News

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA O LIII DIA MUNDIAL DAS COMUNICAÇÕES SOCIAIS

(2 DE JUNHO DE 2019)

« “Somos membros uns dos outros” (Ef 4, 25): das comunidades de redes sociais à comunidade humana »

Queridos irmãos e irmãs!

Desde quando se tornou possível dispor da internet, a Igreja tem sempre procurado que o seu uso sirva o encontro das pessoas e a solidariedade entre todos. Com esta Mensagem, gostaria de vos convidar uma vez mais a refletir sobre o fundamento e a  importância do nosso ser-em-relação e descobrir, nos vastos desafios do atual panorama comunicativo, o desejo que o homem tem de não ficar encerrado na própria solidão.

As metáforas da «rede» e da «comunidade» 

Hoje, o ambiente dos mass-media é tão invasivo que já não se consegue separar do círculo da vida quotidiana. A rede é um recurso do nosso tempo: uma fonte de conhecimentos e relações outrora impensáveis. Mas numerosos especialistas, a propósito das profundas transformações impressas pela tecnologia às lógicas da produção, circulação e fruição dos conteúdos, destacam também os riscos que ameaçam a busca e a partilha duma informação autêntica à escala global.

Se é verdade que a internet constitui uma possibilidade extraordinária de acesso ao saber, verdade é também que se revelou como um dos locais mais expostos à desinformação e à distorção consciente e pilotada dos factos e relações interpessoais, a ponto de muitas vezes cair no descrédito.

É necessário reconhecer que se, por um lado, as redes sociais servem para nos conectarmos melhor, fazendo-nos encontrar e ajudar uns aos outros, por outro, prestam-se também a um uso manipulador dos dados pessoais, visando obter vantagens no plano político ou econômico, sem o devido respeito pela pessoa e seus direitos. As estatísticas relativas aos mais jovens revelam que um em cada quatro adolescentes está envolvido em episódios de cyberbullying.[1]

Na complexidade deste cenário, pode ser útil voltar a refletir sobre a metáfora da rede, colocada inicialmente como fundamento da internet para ajudar a descobrir as suas potencialidades positivas. A figura da rede convida-nos a refletir sobre a multiplicidade de percursos e nós que, na falta de um centro, uma estrutura de tipo hierárquico, uma organização de tipo vertical, asseguram a sua consistência. A rede funciona graças à comparticipação de todos os elementos.

Reconduzida à dimensão antropológica, a metáfora da rede lembra outra figura densa de significados: a comunidade. Uma comunidade é tanto mais forte quando mais for coesa e solidária, animada por sentimentos de confiança e empenhada em objetivos compartilháveis.

Como rede solidária, a comunidade requer a escuta recíproca e o diálogo, baseado no uso responsável da linguagem.

No cenário atual, salta aos olhos de todos como a comunidade de redes sociais não seja, automaticamente, sinônimo de comunidade. No melhor dos casos, tais comunidades conseguem dar provas de coesão e solidariedade, mas frequentemente permanecem agregados apenas indivíduos que se reconhecem em torno de interesses ou argumentos caraterizados por vínculos frágeis. Além disso, na social web, muitas vezes a identidade funda-se na contraposição ao outro, à pessoa estranha ao grupo: define-se mais a partir daquilo que divide do que daquilo que une, dando espaço à suspeita e à explosão de todo o tipo de preconceito (étnico, sexual, religioso, e outros). Esta tendência alimenta grupos que excluem a heterogeneidade, alimentam no próprio ambiente digital um individualismo desenfreado, acabando às vezes por fomentar espirais de ódio. E, assim, aquela que deveria ser uma janela aberta para o mundo, torna-se uma vitrine onde se exibe o próprio narcisismo.

A rede é uma oportunidade para promover o encontro com os outros, mas pode também agravar o nosso autoisolamento, como uma teia de aranha capaz de capturar. Os adolescentes é que estão mais expostos à ilusão de que a social web possa satisfazê-los completamente a nível relacional, até se chegar ao perigoso fenômeno dos jovens «eremitas sociais», que correm o risco de se alhear totalmente da sociedade. Esta dinâmica dramática manifesta uma grave rutura no tecido relacional da sociedade, uma laceração que não podemos ignorar.

Esta realidade multiforme e insidiosa coloca várias questões de caráter ético, social, jurídico, político, econômico, e interpela também a Igreja. Enquanto cabe aos governos buscar as vias de regulamentação legal para salvar a visão originária duma rede livre, aberta e segura, é responsabilidade ao alcance de todos nós promover um uso positivo da mesma.

Naturalmente não basta multiplicar as conexões, para ver crescer também a compreensão recíproca. Então, como reencontrar a verdadeira identidade comunitária na consciência da responsabilidade que temos uns para com os outros inclusive na rede on-line?

«Somos membros uns dos outros»

Pode-se esboçar uma resposta a partir duma terceira metáfora – o corpo e os membros – usada por São Paulo para falar da relação de reciprocidade entre as pessoas, fundada num organismo que as une. «Por isso, despi-vos da mentira e diga cada um a verdade ao seu próximo, pois somos membros uns dos outros» (Ef 4, 25). O facto de sermos membros uns dos outros é a motivação profunda a que recorre o Apóstolo para exortar a despir-se da mentira e dizer a verdade: a obrigação de preservar a verdade nasce da exigência de não negar a mútua relação de comunhão. Com efeito, a verdade revela-se na comunhão; ao contrário, a mentira é recusa egoísta de reconhecer a própria pertença ao corpo; é recusa de se dar aos outros, perdendo assim o único caminho para se reencontrar a si mesmo.

A metáfora do corpo e dos membros leva-nos a refletir sobre a nossa identidade, que se funda sobre a comunhão e a alteridade. Como cristãos, todos nos reconhecemos como membros do único corpo cuja cabeça é Cristo. Isto ajuda-nos a não ver as pessoas como potenciais concorrentes, considerando os próprios inimigos como pessoas. Já não tenho necessidade do adversário para me autodefinir, porque o olhar de inclusão, que aprendemos de Cristo, faz-nos descobrir a alteridade de modo novo, ou seja, como parte integrante e condição da relação e da proximidade.

Uma tal capacidade de compreensão e comunicação entre as pessoas humanas tem o seu fundamento na comunhão de amor entre as Pessoas divinas. Deus não é Solidão, mas Comunhão; é Amor e, consequentemente, comunicação, porque o amor sempre comunica; antes, comunica-se a si mesmo para encontrar o outro. Para comunicar connosco e Se comunicar a nós, Deus adapta-Se à nossa linguagem, estabelecendo na história um verdadeiro e próprio diálogo com a humanidade (cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Dei Verbum, 2).

Em virtude de termos sido criados à imagem e semelhança de Deus, que é comunhão e comunicação-de-Si, trazemos sempre no coração a nostalgia de viver em comunhão, de pertencer a uma comunidade. Como afirma São Basílio, «nada é tão específico da nossa natureza como entrar em relação uns com os outros, ter necessidade uns dos outros».[2]

O panorama atual convida-nos, a todos nós, a investir nas relações, a afirmar – também na rede e através da rede – o caráter interpessoal da nossa humanidade. Por maior força de razão nós, cristãos, somos chamados a manifestar aquela comunhão que marca a nossa identidade de crentes. De facto, a própria fé é uma relação, um encontro; e nós, sob o impulso do amor de Deus, podemos comunicar, acolher e compreender o dom do outro e corresponder-lhe.

É precisamente a comunhão à imagem da Trindade que distingue a pessoa do indivíduo. Da fé num Deus que é Trindade, segue-se que, para ser eu mesmo, preciso do outro. Só ou verdadeiramente humano, verdadeiramente pessoal, se me relacionar com os outros. Com efeito, o termo pessoa conota o ser humano como «rosto», voltado para o outro, comprometido com os outros. A nossa vida cresce em humanidade passando do caráter individual ao caráter pessoal; o caminho autêntico de humanização vai do indivíduo que sente o outro como rival para a pessoa que nele reconhece um companheiro de viagem.

Do «like» ao «amen»

A imagem do corpo e dos membros recorda-nos que o uso da social web é complementar do encontro em carne e osso, vivido através do corpo, do coração, dos olhos, da contemplação, da respiração do outro. Se a rede for usada como prolongamento ou expetação de tal encontro, então não se atraiçoa a si mesma e permanece um recurso para a comunhão. Se uma família utiliza a rede para estar mais conectada, para depois se encontrar à mesa e olhar-se olhos nos olhos, então é um recurso. Se uma comunidade eclesial coordena a sua atividade através da rede, para depois celebrar juntos a Eucaristia, então é um recurso. Se a rede é uma oportunidade para me aproximar de casos e experiências de bondade ou de sofrimento distantes fisicamente de mim, para rezar juntos e, juntos, buscar o bem na descoberta daquilo que nos une, então é um recurso.

Assim, podemos passar do diagnóstico à terapia: abrir o caminho ao diálogo, ao encontro, ao sorriso, ao carinho… Esta é a rede que queremos: uma rede feita, não para capturar, mas para libertar, para preservar uma comunhão de pessoas livres. A própria Igreja é uma rede tecida pela Comunhão Eucarística, onde a união não se baseia nos gostos [«like»], mas na verdade, no «amen» com que cada um adere ao Corpo de Cristo, acolhendo os outros.

Vaticano, na Memória de São Francisco de Sales, 24 de janeiro de 2019.

Franciscus

[1] Para circunscrever o fenômeno, será instituído um Observatório internacional sobre cyberbullying, com sede no Vaticano.

[2] Grandes Regras, III, 1: PG 31, 917. Cf. Bento XVI, Mensagem para o XLIII Dia Mundial das Comunicações Sociais (2009).